FRASE - PENSAMENTO

1- DAI-ME SENHOR A PERSEVERANÇA DAS ONDAS DO MAR, QUE FAZEM DE CADA RECUO UM PONTO DE PARTIDA.

2- Os governos confundem "Padrão Fifa" com "Patrão Fifa", e aí fazem tudo que ela manda. (Blog de Jose Simão).

3- É melhor calar-se e deixar que as pessoas pensem que você é um idiota do que falar e acabar com a dúvida. (Abraham Lincoln)

4- Nada é mais temido por um covarde do que a liberdade de pensamento (Luiz Felipe Pondé).

5- Existe no silêncio uma tão profunda sabedoria que às vezes ele se transforma na mais profunda resposta (Fernando Pessoa).

6- Conheça-te a ti mesmo, torna-te consciente de tua ignorância e serás sábio. - Quatro características deve ter um juiz: ouvir cortesmente, responder sabiamente, ponderar prudentemente, e decidir imparcialmente. (Sócrates).

7- “Deus lapidou a mulher com o cinzel do amor e o malhete da harmonia preparando-a para ser mãe.” (Marikaa)

8- "A espada sem a balança é a força bruta; a balança sem a espada é o direito impotente; completam-se mutuamente: e, na realidade, o direito só reina quando a força dispendida pela justiça para empunhar a espada corresponde à habilidade que emprega em manejar a balança". Rudolf von Ihering
9- "Uma Nação, com N maiúsculo, precisa de eficiência de alto a baixo - desde a rede de energia até a rede de esgoto". (Alex Campos - Jornalista)
10- "Não vamos desistir do Brasil". (Eduardo Campos)
11- Devemos entregar nossas questões ambientais aos ambientalistas, aos técnicos ambientais, e aos geólogos, se desejarmos alguma conquista, pois se deixarmos por conta da Justiça, dos Tribunais, dos políticos, não haverá solução.
12- Preliminarmente urge dizer:
"Sei que minha caminhada tem um destino e um sentido, por isto devo medir meus passos, devo prestar atenção no que faço e no que fazem os que por mim também passam ou pelos quais passo eu... " Que eu não me iluda com o ânimo e o vigor dos primeiros trechos, porque chegará o dia em que os pés não terão tanta força e se ferirão no caminho, cansando-se mais cedo... Todavia, quando o cansaço houver chegado, que eu não me desespere e acredite que ainda terei forças para continuar, principalmente, quando houver quem me auxilie..." E, pode-se dizer mais, que nesta caminhada descobre-se que a aposentadoria não é concreta (apesar do Decreto), é abstrata, um novo estado de espírito, de quem sai da ativa para a inativa, "in casu" torna-se uma "via crucis", um sofrimento que impede um planejamento futuro. Se alguém chegou, haverei de também chegar, ainda acreditando que tenho forças e que haverá quem me seja justo." (pelo blogueiro à época dirigido ao Conselheiro do TCE-RJ).

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

MUNICIPALISMO - PARTE 1



PARTE 1 - MUNICIPALISMO
PARTE 2 - MUNICÍPIO - ENTE FEDERATIVO
PARTE 3 - AUTONOMIA MUNICIPAL
PARTE 4 - MUNICIPIO - COMPETÊNCIA CONCORRENTE
PARTE 5 - MUNICIPIO - COMPETÊNCIA SUPLEMENTAR

PARTE 1

MUNICIPALISMO, NATION BUILDING E A MODERNIZAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL

Marcus André B. C. de Melo

Introdução

A ideologia municipalista constitui uma das construções discursivo-programáticas mais antigas e resilientes da cultura política brasileira. Como se analisa a seguir, essa resiliência e capacidade de renovação está associada, fundamentalmente, à ambigüidade do conceito. Assim o municipalismo adquire, em larga medida, o status de "leito de Procusto" de componentes importantes da cultura política nacional. No entanto, pode-se localizar períodos da história republicana em que o municipalismo adquire notável capacidade de mobilização e surpreendente apelo programático, como ocorre no Estado Novo e no pós-guerra. O presente texto explora, analiticamente, as origens e o desenvolvimento do municipalismo e sua relação com a modernização do Estado no Brasil, no período 1920-1960. Nesse sentido são analisados: a genealogia do municipalismo e sua relação com a ideologia antiurbana da República Velha; o discurso e a prática municipalista no Estado Novo; os desdobramentos institucionais do movimento municipalista durante a redemocratização do país: a Associação Brasileira de Municípios e o Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM); e, finalmente, sua conversão em instrumento racionalizador da moderna gestão urbana no país.

Municipalismo, agrarismo, federalismo e cultura política

Historicamente, as ideologias antiurbanas e agraristas constituíram construções programáticas importantes que floresceram no contexto de tránsição das sociedades agrárias para as sociedades urbano-industriais. Os exemplos mais destacados de ideologias antiurbanas são os populismos agrários russo e americano dos fins do século XIX. A ideologia que permeou parte importante da produção intelectual e artística inglesa dos séculos XVIII e XIX inscreve-se na mesma matriz. Tal matriz estruturou-se, como amplamente discutido na literatura, no contexto da rejeição à nova ordem burguesa e urbano-industrial. Ao lado das utopias socialistas e operárias e das construções do pensamento conservador católico, a ideologia antiurbana e o agrarismo constituem peça importante do repertório intelectual e político de reação à nova ordem que emergiu no século XIX.

No Brasil, o agrarismo e o municipalismo - que, como se verá, mantêm afinidades eletivas - remontam ao Segundo Reinado. Na realidade, o municipalismo tem precedência histórica, emergindo com a crítica que importantes pensadores e publicistas liberais fizeram à centralização política. Durante o Império é que nasce a bandeira municipalista. Embora ainda não imbricada com o agrarismo, a questão da autonomia municipal e provincial era uma peça importante - senão fundamental - da crítica política dos liberais. E nesse contexto que emergem construções intelectuais mais acabadas, sobretudo associadas à figura que veio a se consagrar como o principal ideólogo do municipalismo, Tavares Bastos.(1) Profundamente marcado pela leitura de Tocqueville, Tavares Bastos propugnava pela descentralização administrativa e política do Império, e pelo rompimento com o modelo monárquico, unitarista e centralizador, de inspiração francesa, adotado no país. Seu ideal era a República federativa, cuja encarnação concreta era a jovem nação americana louvada por Tocqueville. A crítica que tecia era sobretudo de ordem política e administrativa e era centrada na noção de autonomia. Com efeito, o local self-government, que tanto enaltecia, e o programa abrangente de descentralização que elaborou em A Província, confundiam-se com um projeto de ampliação da participação política - pela generalização de eleições - e de liberalização do regime. República e federação eram conceitos assimilados por vários publicistas - dos quais Bastos é o maior expoente - à idéia de municipalismo. Com efeito, a "polêmica do federalismo vinha se concentrando" - ao final do Segundo Reinado - na bandeira da "libertação do município" (Carvalho, 1946:78; cf. também Maia, 1883). Carneiro Maia, por exemplo, tendo em mente os ideais republicanos, assinalava em 1882 que "quando se visa um plano sensato de reformação social, é preciso construir de baixo para cima" (1983:XII).

A fusão entre o municipalismo e o ruralismo ocorreu, na República Velha, na obra de Alberto Torres. Em larga medida - e paradoxalmente - as idéias de Torres correspondem a uma crítica ao ideal federativo de Tavares Bastos. Mais acertadamente, sua obra deve ser entendida como uma crítica à não-realização plena e à inviabilidade do projeto (utópico) de uma nação construída pela agregação de interesses individuais e grupais de caráter local. O agrarismo emerge como a construção intelectual que descobre o país real, estruturado por clãs locais dispersos nos municípios num imenso território, e o país legal, idealizado e inorgânico. Torres, como já amplamente discutido, foi o principal articulador ideológico da noção de que o Brasil seria uma nação de vocação eminentemente agrária. Em A Organização Nacional - obra que forneceu as balizas ideológicas do ciclo da Revolução de 30 - Torres explora temáticas que se tornaram, subseqüentemente, idéias-força da cultura política brasileira: a da vocação rural da nação e da disjunção entre o país real e o país legal, o que levaria, para sua superação, à necessidade de um Estado forte e centralizado (Torres, 1978). Esta última distinção encerra uma dimensão territorial: o país legal é, nessa perspectiva, o país urbano, "sibarita" e cosmopolita, enquanto o país real é o mundo rural - onde jaz o cerne da brasilidade. Para Torres, a instauração do regime federativo no país representou seu "desmembramento" e a exacerbação do isolamento dos municípios.(2) Como já amplamente explorado na literatura, o tema da redenção do mundo rural permeava o projeto de um importante setor da intelectualidade brasileira, do qual fazem parte Alberto Torres, Euclides da Cunha, Monteiro Lobato e, principalmente, Oliveira Vianna. Como ideólogo quase oficial do Estado Novo, Oliveira Vianna veio a ter, como se sabe, profunda influência na formulação das políticas públicas da era Vargas.

Para Vianna, "o brasileiro, entregue a seus pendores e instintos, é antes de tudo um homem do campo. (...) É este o traço realmente nacional de seu carácter". (Vianna,1975:19). Essa visão se associava à noção paralela de que a industrialização representava um processo artificial. O debate corrente na década de 30, em que se alinhavam os críticos das "indústrias artificiais", por um lado e os ideólogos da industrialização, por outro, é marcado fortemente, como se sabe, pelo tema do agrarismo introduzido por Torres e Vianna. O processo de urbanização era também visto não só como artificial, mas também como profundamente danoso ao país, intimamente associado à degeneração do caráter nacional, em sua visão.

"o que está dando à nossa sociedade essa apparência de corrupção e degeneração (...) pode-se compendiar nesa formula synthetica: - tendência, de origem recente, das classes superiores e dirigentes do paiz a se concentrarem nas capitaes. (Vianna, 1975:21, grifado no original).

Antecipando críticas contemporâneas da burocratização da vida política, Vianna afirmava que:

"no império, a relação social dessas duas classes (doutores e políticos) podia ser figurada pela equação: político mais doutor = fazendeiro; na República, esta equação se altera e passa a ser formulada assim: político + doutor = burocrata. Parece nada; mas, é uma revolução" (idem, p. 26, grifado no original).

O que Vianna está criticando é, na realidade, o patrimonialismo. A expansão de um sistema político caracterizado pela existência de uma classe cada vez mais numerosa de profissionais da política, que tem no aparelho burocrático do Estado o instrumento de sua reprodução social. O mundo urbano constitui-se, nessa perspectiva, no locus privilegiado desse estamento burocrático que é o germe dos faccionalismos de toda ordem. A equação de Vianna formulada em termos contemporâneos é que a a urbanização equivaleria à expansão do patrimonialismo. O caráter esparso e rarefeito da urbanização do país, restringindo-se à faixa costeira e em função do comércio exterior, expressaria, nessa perspectiva, seu conteúdo artificial e anômalo: as cidades estavam de costas para a nação. A solução, apontada por Vianna numa conhecida polêmica com Olavo Bilac, é "o retorno aos campos":

O dia em que os nossos doutores e os nossos políticos actuaes assentarem, como as gerações de há cincoenta asnos passados, na posse tranquilla de um domínio rural, o seu ideal de felicidade, a alegria voltará ao nosso povo; o tonus moral da sociedade se revitalizará de prompto; a lucta pelas posições não imporá às consciências o sacrifício dos seus escrupulos superiores. (idem, p. 27, grifado no original).

A "utopia" de Vianna (Carvalho, 1991) expressa prima facie uma reação de elites rurais face à perda de sua hegemonia, num quadro de transição para a sociedade urbano-industrial. Essa interpretação foi criticada por Gomes (1980) numa análise penetrante. Na realidade, a ideologia antiurbana de Vianna associava-se também a uma crítica da grande propriedade fundiária e, sobretudo, à utopia de uma sociedade assentada na média propriedade e numa classe média rural. Nesse sentido, a ideologia antiurbana no Brasil da República Velha- ao contrário de suas congêneres nos EUA e Europa - aponta para um projeto de transformação e modernização da sociedade, e não de restauração de uma ordem pretérita.

O caráter modernizaste e militante da ideologia antiurbana manifesta-se nos inúmeros manifestos e propostas enunciados durante o ciclo da Revolução de 30. Na década de 20, o agrarismo enquanto estratégia de nation building informou a formulação das campanhas de saúde pública (Santos, 1985). Seria na década de 30, no entanto, que essa estratégia encontraria expressão política mais abrangente - mas que permaneceria como projeto. Como assinala Gomes, o componente essencial e radical da ideologia agrarista - a reforma agrária viabilizando uma classe média de pequenos e médios produtores "à americana" - malogrou. O agrarismo, portanto, constituiu, em larga medida, a dimensão não-realizada, perdedora, do projeto de modernização brasileiro gestado na República Velha.

Numa perspectiva ex post pode-se afirmar que o ciclo da Revolução de 30 está associado simultaneamente ao ideário antiurbano e à construção da identidade urbana do país. Na realidade, ao longo desse período processou-se uma transmutação onde a dimensão urbana do varguismo aparece como a contraface do ruralismo - e o supera (Gomes, 1987). O abandono do agrarismo não parece estar associado a um projeto articulado que a ele se oponha no plano político. Parece antes ser o produto não antecipado de um conjunto complexo de projetos qüe foram gestados entre 1930 e 1945, no seio da coalizão multifacetada que viabilizou as transformações ocorridas.(3)

Manifestações diversas do agrarismo podem ser encontradas nas propostas de partidos e associações como a Sociedade de Amigos de Alberto Torres e o Clube Três de Outubro.(4) No Estado Novo, sua expressão paradigmática é o programa "Marcha para o Oeste", lançado em 1941 (Azevedo, 1988). A redenção do sertão teria início com a ocupação do território nacional, a partir da criação de colônias agrícolas no interior do país - projeto que, significativamente, mantinha intocada a estrutura agrária. O agrarismo modernizador informou também parte importante do projeto de modernização administrativa implantado na era Vargas. A criação de órgãos essenciais à estratégia de modernização do país, como o Instituto Nacional de Estatística, INE (1934), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE (1938), e o Departamento Administrativo do Serviço Público, DASP (1938), foi fortemente influenciada pelo ideário ruralista e municipalista. Como será analisado em seguida, foi exatamente nesses órgãos que se gestou a elite burocrática que formulou o municipalismo pragmático da década de 40. Vale enfatizar, por exemplo, que o IBGE-que foi uma instituição central nesse movimento - foi criado como órgão de administração colegiada, em cuja direção os estados, os municípios e a União tinham paridade de representação, numa clara estratégia de construir a nação a partir do município. (Valdemar Lopes, entrevista ao autor).

Após a Revolução de 30 e particularmente durante o Estado Novo, o municipalismo foi elevado à condição de princípio programático das elites governamentais e de peça importante da estratégia de nation-building perseguida.(5) Exemplo destacado é a proposta, na Constituinte de 1934, do ex-tenente e ministro Juarez Tavora - e também presidente da Sociedade de Amigos de Alberto Torres - de reorganização do país em uma federação municipalista. Nela, os estados desempenhariam apenas o papel de "intermediário escrupuloso entre a união soberana e os municípios autônomos, com a finalidade precípua de adaptar as normas gerais emanadas daquela, às peculiaridades locais destes" (Távora citado em Duarte, 1942:201). A extensa literatura propagandística e a produção intelectual de pensadores e de juristas "oficiais" do regime, como Almir de Andrade e Francisco Campos, associavam o federalismo e a descentralização à degeneração da vida política e aos faciosismos políticos da República Velha.(6) A "tendência descentralizadora" da Constituição de 1891, nessa perspectiva, teria "permitido que o município se constituísse em verdadeira organização localista e desagregadora das energias nacionais" (Andrade, 1941:183). Com efeito, nessa literatura, federalismo e regionalismo eram entendidos como antagônicos aos interesses nacionais e coletivos. Num quadro em que os partidos políticos eram agremiações estaduais, os estados encapsulavam a própria noção de política. O episódio da queima das bandeira estaduais, em ritual cívico durante o Estado Novo, não poderia ser mais expressivo dessa visão.

A adoção da ideologia municipalista no Estado Novo representaria um paradoxo. Por um lado, a Constituição de 1937 e a legislação específica sobre municípios é profundamente centralizadora. A autonomia do município em matéria financeira, por exemplo, foi restringida, como também foi proibido o endividamento externo municipal. Por outro lado, a Constituição elege o município "como órgão constituinte dos poderes".(7) O Estado Novo apresenta-se como a encarnação do "verdadeiro municipalismo", o qual, supostamente, transcenderia princípios constitucionais vazios como o de "peculiar interesse local". Para além do idealismo da Constituição - para parafrasear Oliveira Vianna - e suas disposições estranhas ao "gênio" brasileiro, a vida econômica e política local seriam redimidas.

O paradoxo entre o ideário municipalista e a prática centralista dissolve-se quando se incorpora à análise a crítica autoritária - e hegemônica nos anos 30 - ao conceito liberal de representação. Embora o projeto político das elites autoritárias da Era Vargas se caracterize por uma profunda centralização política, administrativa e financeira - e, portanto, contrária ao conceito de autonomia que é subjacente ao municipalismo -, ele se baseia numa concepção plebiscitária (Pitkin, 1967) e corporativa de representação política. Nessa concepção, o município - matriz básica da sociedade política - está orgânica e simbioticamente entrelaçado com o poder central. Sem mediações - de instâncias territoriais ou político-partidárias - que distorçam essa identidade de fins, a articulação entre os dois níveis está assegurada pela centralização, que aproxima e reúne os dois pólos. O município emerge, nessa perspectiva, como uma esfera comunitária - portanto pré-política - que acomoda apenas a coletividade das famílias e seus valores ainda não distorcidos pelas instâncias de representarão. Essa reunião entre os dois pólos, no entanto, é que permitiria a instauração da esfera pública sobre a ordem privada, particularista e não-comunitária. Essa visão contrasta fortemente com a visão municipalista liberal - articulada por Rui Barbosa - que busca resguardar essa esfera privada da esfera pública. Para esse autor, na linha de Taine a quem ele se refere, o município é um "sindicato privado", "não tem política, não está na esfera política. Sua administração pertence à categoria dos negócios comerciais" (Barbosa, 1898:287).

Verifica-se, assim; que por sua ambigüidade, o municipalismo pode ser apropriado de formas múltiplas, permitindo que possa se constituir numa das mais arraigadas e reiteradas peças discursivas da cultura política brasileira. O municipalismo adquire o status de "leito de Procusto" dessa cultura política: uma ideologia perene e consensual que não encontra opositores no campo político.

Administração versus política: a campanha municipalista e a criação da ABM e do IBAM

A invenção da tradição municipalista

Durante a redemocratização de 45, o municipalismo ressurge com um apelo doutrinário espetacular, vindo a ter forte penetração na Constituinte de 1946. Não seria exagerado supor que se buscou, em larga medida, convertê-lo em mito fundador da segunda República. Durante a campanha presidencial, o municipalismo ocupou lugar de destaque na agenda pública, levando ao surgimento da Campanha Municipalista e à criação da Associação Brasileira de Municípios (ABM). O municipalismo - por sua ambigüidade - cumpriu o papel singular de reconciliar varguistas e antivarguistas na Constituinte de 46. Ele incorporava, a um só tempo, a ideologia rural salvacionista do Estado Novo e a crítica ao centralismo e à perda de autonomia das instâncias subnacionais ocorrida no período. Embora o municipalismo tenha tido forte penetração nos círculos de juristas liberais de oposição ao Estado Novo, a liderança da Campanha, que se filiava estreitamente à tradição intelectual do agrarismo modernizador, não entendia a questão da autonomia política - consubstanciada na questão da eletividade dos prefeitos - como a bandeira central do municipalismo:

"O problema do município, no Brasil, não consiste, apenas, em atribuir-lhe, por processos de concessão legislativa, maior ou menor grau de autonomia. Não é eletivo, nem tampouco doutrinário (...) É problema tipicamente agrário (...)". Com efeito, "no atual sistema econômico, em que predomina o regime latifundiário e os processos econômicos dele decorrentes (...) a autonomia política de caráter meramente constitucional servirá, apenas, para prolongar os males coloniais: a entronização, no poder, dos representantes da elite rural, expressões legítimas dos grandes proprietários de terras e incondicionais defensores desse clima de desigualdade favorável aos seus interesses" (Medeiros, 1947:50, meu grifo).

Traços marcantes do agrarismo podem ser encontrados, também, no discurso de instalação da ABM, pelo seu presidente, apresentado pela Campanha Municipalista à Assembléia Constituinte e no qual se apontava o mal maior que afligia o país: "a criação de uma indústria artificial, em sua quase generalidade" e o desequilíbrio surgido entre esta e a produção agrícola (Xavier, 1946). Esse "surto industrial" teria determinado "a concentração demográfica em certos centros urbanos", o que teria acarretado "sensível desfalque nos municípios" (Medeiros, 1947:95). O tom moral da ideologia antiurbana adquire nesse discurso grande força:

"As indústrias destinadas a manter uma vida de prazeres e luxo, e que normalmente são as mais lucrativas, cresceram e se muliplicaram nas metrópoles. As demais igualmente nelas se reuniram, em busca de maiores mercados de consumo (...) Além disso, favoreceram a concentração: as grandes construções; a burocracia, rendosa e fácil; os negócios; as atrações naturais dos grandes centros; e, ainda, com seu cortejo de misérias morais, o jogo, que no Brasil chegou a eliminar os últimos resquícios de pudor dos homens públicos, os quais transformaram a roleta e o vício em fonte de renda (...) sob o pretexto de atender, com o produto dessa criminosa exploração, as obras de caráter social. Os cassinos deslumbrantes e o pif-paf, ainda que em modestos lares, simbolizam uma época e comprometem os destinos de um povo" (Xavier, 1946:4, meu grifo).

Em outro lugar Xavier concluía de forma espetacular que "este estado de coisas demorou tanto que já o urbanismo, no Brasil, devorou o país e agora também se acha dominado pela autodestruição" (Xavier, 1948:66, meu grifo). O momento para ele era de crise:

"Chegamos ao clímax da crise que a inépcia dos nossos grupos dirigentes teimou em criar, numa inconsistente e vaidosa incompetência que se manifesta no ingênuo orgulho dos nossos pseudo-estadistas pelas avenidas abertas, pelos prédios de mau gosto construídos, num requinte de luxo em que se extasiava a basbaquice nacional".

O leitmotif da campanha era, como se vê, a modernização do "interior". Deve-se notar, no entanto, que a questão da autonomia política dos municípios era fundamental por seu apelo simbólico. Assim se assiste, nesse período, a uma elaboração discursiva, mítica e apologética em torno da autonomia das câmaras municipais no Brasil colônia e do papel do município nos movimentos nativistas (cf. entre muitos outros: Zenha, 1948; Medeiros, 1947; para uma discussão teórica, Guimarães, 1988). Reinventa-se, nesse movimento, a tradição para descobrir um suposto país real na esfera local.

Malgrado sua vinculação com movimentos sociais de resistência à ditadura, o municipalismo emerge no pós-guerra como uma construção intelectual elaborada, no âmbito do Estado, por elites burocráticas, e que mantém, como assinalado, uma associação estreita com a tradição intelectual autoritária e modernizadora da República Velha. Nesse sentido, a campanha municipalista deve ser entendida como uma estratégia discursiva dessas elites e não como um movimento social galvanizador de demandas de elites locais insatisfeitas com o Estado Novo.

Para além de sua forte influência na Constituição de 1946 - expressa interalia na nova repartição intergovernamental de receitas entre níveis de governo e na nova definição liberal da autonomia municipal - a campanha municipalista logrou ter, como será analisado, um impacto decisivo nas políticas públicas. (Medeiros, 1947:104-20; Sobrinho, 1950). A cruzada municipalista adquiriu maior articulação com a criação da ABM, em 15 de março de 1946. O timing dessa criação é expressivo: buscava-se consolidar um lobby municipalista na Constituinte, que então iniciava seus trabalhos. O programa da ABM incluía entre seus objetivos: o estudo da organização, do funcionamento e dos métodos de trabalho dos municípios brasileiros, visando sua melhoria; a promoção de intenso intercâmbio entre os vários municípios e à assistência técnica aos mesmos; a disseminação das técnicas de administração municipal, mediante realização de conferências, congressos e publicações; e a consecução dos objetivos de cooperação da Comissão Interamericana de Cooperação Intermunicipal, de acordo com as recomendações dos Congressos Panamericanos de Municipalidades e da VI Conferência Americana Internacional.(8)

A forte mobilização nos meios intelectuais e burocráticos e o êxito espetacular da campanha levaram a que se propusesse a idéia de conversão do movimento em partido político. A proposta partiu de militantes do Movimento Popular Municipalista, liderados por Valadão Furquim no interior de São Paulo, que encaminharam o projeto de transformação do movimentó em partido político: o Partido Municipalista Nacional. Explicitou-se nesse contexto uma clivagem entre um projeto técnico-modernizador e o projeto político-partidário de subelites políticas rurais alijadas da política "maior". O primeiro desses projetos está associado à elite burocrática do IBGE, DASP, FGV e do INE. Rafael Xavier, secretário geral do IBGE e líder da campanha municipalista, emerge como o articulador central desse projeto, juntamente com Arízio Vianna (presidente do DASP nas décadas de 40 e 50) e Simões Lopes (presidente da FGV e diretor geral do DASP nas décadas de 30 e 40). Para Raphael Xavier, que se torna o primeiro presidente da ABM, a reversão do "abandono das populações rurais" exigia uma mudança profunda na administração municipal, viabilizada mediante o levantamento de informações sobre os municípios brasileiros e programas de assistência técnica. Essa perspectiva, que poderia ser chamada de "ruralismo pedagógico" e modernizador, permeava as propostas das elites burocráticas.(9) Nesse sentido, ele se opunha fortemente à idéia de criação de um partido político. O problema, nessa perspectiva, era precisamente a excessiva politização do município e a conseqüente necessidade de insulamento burocrático da gestão municipal. Daí a necessidade de manter "intocadas pelo veneno que intoxica o nosso ambiente político as vertentes que alimentam o municipalismo". O municipalismo deveria se manter "num plano mais elevado e neutro" (Xavier, 1949).(10)

A resposta governamental à forte visibilidade alcançada pelo "municipalismo" foi a proposta de criação da Fundação dos Municípios. Formulada por uma comissão que incluía elementos destacados da elite burocrática como Xavier e Mário Augusto Teixeira de Freitas (presidente da Sociedade Brasileira de Estatística e idealizador do IBGE), a proposta foi encaminhada pelo ministro da Justiça - e municipalista notório - Dr. Adroaldo Mesquita da Costa e endossada pelo presidente Dutra. A opção por uma forma organizacional autônoma - a fundação - buscava arrefecer a reação intensa às propostas centralizadoras que eram associadas ao Estado Novo. Segundo o ministro Costa "a estrutura de fundação é a única alternativa eficiente e democrática que combina iniciativa privada e ação governamental. Ela evita de uma vez por todas os inconvenientes e a desconfiança que limitam desde o início a ação exclusiva do governo federal" (citado por Pinto, 1968:175). Vale notar que, no seio da própria comissão, setores da elite técnica, como é o caso de Raphael Xavier, opunham-se à ingerência governamental na ABM e na nova fundação, pelo medo da partidarização do municipalismo. Daí haver insistido na proposta de uma fundação privada. Segundo seus formuladores; o governo federal não estaria oferecendo um "cavalo de Tróia" aos municípios. A nova instituição não seria nem o "falso amigo" nem o "pai super protetor", e só "agiria quando requisitada" (idem). O conselho diretor do novo órgão no entanto deixava entrever seu caráter oficialista, pois incluía desde representantes do Estado Maior das Forças Armadas até representações corporativistas da indústria e do comércio.

Para setores amplos do movimento municipalista a proposta do novo órgão representava uma estratégia de cooptação do governo central, com possibilidade de esvaziamento da ABM. Durante o I Congresso Brasileiro dos Municípios, realizado em Petrópolis em 1950, esses setores romperam com a liderança técnica da ABM que havia, após resistência inicial, apoiado a proposta. Juntamente com o projeto de criação do Instituto de Administração Municipal, o projeto da Fundação dos Municípios foi rejeitado e a ABM foi consagrada como o braço técnico do municipalismo. Segundo Joaquim Neves Pereira, um dos fundadores do IBAM, ambas as propostas foram rejeitadas por serem entidades semi-oficiais, que poderiam se tornar, portanto, instrumentos de opressão política contra os municípios adversários do grupo do governo em algum momento (Pereira, 1952:57). Após essa rejeição, a elite burocrática da ABM rearticulou um novo projeto divulgado um mês antes da realização do II Congresso Brasileiro de Municípios, em outubro de 1952, em São Vicente, São Paulo. Buscava-se, assim, a mobilização dos municipalistas para a proposta. O projeto foi divulgado na forma de um manifesto aos prefeitos e vereadores do país. O manifesto reiterava que a nova instituição só atuaria quando solicitada e que não era órgão do governo, nem entidade paraestatal. O IBAM, afirmava-se, era uma sociedade civil fundada por homens desinteressados e de boa vontade.(11)

O locus organizacional do grupo formulador dessas propostas era o DASP, o IBGE, a Comissão Nacional de Assistência Técnica (CNAT) e a recém-criada Escola Brasileira de Administração Pública (EBAP), da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Esse rapprochement com a FGV deu-se através do programa de cooperação técnica em administração pública, criado no âmbito do Point Four (USAID), que levou à criação da EBAP.(12) É assim que Cleantho de Paiva Leite, presidente da CNAT, membro fundador da FGV e membro do Conselho de Administração do BNDE, passa a ser a figura-chave na formulação da proposta do IBAM. A nova proposta, formulada por Cleantho Leite e Raphael Xavier, foi finalmente endossada pelo movimento municipalista no congresso de São Vicente. Xavier rejeitava qualquer associação estreita entre o IBAM e a ABM por receio de que o controle sobre ela por parte de grupos políticos - o que ele acreditava estar se consolidando - viesse a se estender à nova instituição (entrevista citada em Pinto, 1968:196). Em certa medida Xavier transfere para o IBAM as expectativas que nutria em relação à ABM. Cleantho Leite, por outro lado, entendia que, sem o apoio logístico da ABM, o IBAM não teria condições de se articular com os municípios brasileiros. A ABM, em sua visão, adquiriria legitimidade por acomodar uma instituição de caráter eminentemente técnico, num quadro de críticas crescentes a sua politização. Daí ter denominado o arranjo logrado entre as duas instituições de "casamento de conveniência". (idem, p. 202). Com a oficialização do IBAM, Cleantho Leite torna-se seu secretário executivo e dá início a sua consolidação. O primeiro Conselho de Administração do IBAM era composto por destacados membros da elite burocrática: Raphael Xavier (secretário-geral do IBGE, posteriormente diretor executivo da FGV), Arízio Vianna (DASP), Luis Simões Lopes (DASP, FGV), José Maria Araújo Cavalcanti (DASP e secretário geral do Instituto Brasileiro de Ciências Administrativas), Rômulo de Almeida (Banco Nacional de Crédito Cooperativo e assessor econômico do presidente Vargas). Os outros membros eram destacados municipalistas associados à ABM: Oswaldo Trigueiro (exgovernador da Paraíba) e Arnaldo de Junqueira Ayres.

A ABM: o partido político dos políticos?

A fundação do IBAM inaugura uma clivagem irreversível entre o IBAM e o movimento municipalista. Enquanto a vocação urbana e a dimensão modernizadora-reformista do IBAM se consolida, como analisado, o movimento municipalista assume cada vez mais o formato de uma frente nacional de prefeitos. Com efeito, a assertiva de Schriiitter de que a ABM, na década de 60, representava uma espécie de associação brasileira de políticos profissionais é bastante apropriada (Schmitter, 1971). A última grande mobilização do movimento municipalista ocorreu durante a realização do III Congresso Nacional dos Municípios Brasileiros em São Lourenço, Minas Gerais, quando a ABM propôs um plano abrangente e ambicioso de investimentos municipais e passou a desenvolver intensa atividade de lobby junto ao Congresso e ao executivo. A ABM enviou a todos os seus membros carta-circular pedindo para encaminhar à presidência da República solicitação de "um programa de investimentos e obras em condições de merecer o auxílio da União", programa este a ser incluído na proposta orçamentária para 1955. Face à "campanha sem paralelo nos anais do movimento municipalista" (Cavalcanti, 1960:220) e à extraordinária mobilização ocorrida, foi proposto um Plano Nacional de Obras e Serviços Municipais nos 2.500 municípios brasileiros - a Operação Município. (13) Com base na proposta do senador Jarbas Maranhão, foi encaminhado o projeto de lei criando o plano, que teve longa tramitação no Congresso. A "idéia política central" era que "os municípios, embora melhor dotados a partir das quotas constitucionais de que participam, e apesar de todas as emendas orçamentárias formuladas pelos congressistas nos orçamentos federais, não estão sendo beneficiados no sentido do desenvolvimento econômico-social".(14)

A proposta refletia não só a ideologia redentora do ruralismo, mas também a politização crescente da questão dos desequilíbrios regionais. A estratégia proposta era que se realizasse o que se denominava "acordo interpartidário específico", prevendo a realização de "convênios" (um instrumento "moderno" naquele contexto) entre o governo federal e os municípios. A ABM logrou a aprovação da Operação Município, contra a forte resistência dos representantes de São Paulo, que acreditavam que os municípios ricos não iriam se beneficiar (Maranhão, 1960:164-5). Vale notar que as lideranças municipalistas (e parte importante da elite burocrática) eram originárias de estados periféricos: Araújo Cavalcanti, secretário da ABM (PE), Raphael Xavier (AL), Cleantho Leite (PB), Arízio Vianna (ES), Rômulo Almeida (BA), Océlio de Medeiros (AC).. Elas apoiavam - embora não de forma explícita- a idéia de um Estado forte, que assegurasse transferências e promovesse a modernidade. Na realidade, o centralismo burocrático era atacado sobretudo por esvaziar as áreas rurais. Nessa perspectiva, o conteúdo substantivo do municipalismo é a reversão do abandono das populações rurais. Tal abandono resultava da expansão desigual - porque restrita aos núcleos urbanos de maior porte - da esfera pública sobre o território. Para o movimento paulista, em contraste, o municipalismo era equivalente à autonomia política e financeira.(15) Como assinalado anteriormente, é essa ambigüidade radical que permite explicar a resiliência dessa ideologia.

A trajetória subseqüente do municipalismo foge aos limites do presente ensaio. Ao longo da década de 50, o municipalismo perde gradativamente seu caráter reformista e se transforma no que se poderia denominar "partido político dos políticos". A ascenção de Jânio Quadros - que mantinha vínculos históricos com o movimento - à presidência, levou à criação do primeiro órgão federal de assistência aos municípios, o Serviço Nacional de Assistência aos Municípios (SENAM). Por outro lado, as propostas da Operação Município reemergiram com o Programa de Ação Concentrada do Ministério do Interior, durante o regime militar. Vale lembrar, no entanto, que a intensa mobilização municipalista do pós-guerra levou ao projeto de publicação da Enciclopédia de Municípios Brasileiros, na década de 50, projeto gigantesco de coleta e sistematização de dados realizado pelo IBGE (IBGE, 1958, 36 volumes). Monumento ao município brasileiro, a enciclopédia permanece como símbolo e efígie da modernização que nunca houve.

A política da eficiência: a modernidade vai ao município

IBAM: o DASP urbano?

A proposta de criação do IBAM se inscreve-se no processo histórico de construção organizacional do Estado brasileiro que se inicia a partir de 1930. Incumbido de efetuar a reforma da administração pública federal, instituindo o sistema do mérito na seleção de pessoal federal e introduzindo os métodos da moderna administração pública, o DASP constituiu o instrumento privilegiado desse projeto modernizador. A proposta de atuação do IBAM guarda estreita semelhança com a proposta de reforma institucional do DASP. No entanto, no caso do IBAM, a questão era a de como compatibilizar, num contexto democrático e descentralizado, uma estratégia de reforma e modernização da administração municipal por uma instância que não era - e não podia ser - municipal. Implementado durante o Estado Novo, o projeto do DASP, como amplamente investigado, foi inteiramente modelado na reforma do serviço público americano do início do século e nas famosas comissões de eficiência do governo Hoover, na década de 20 (Siegel, 1964; Graham, 1968). O DASP também operou nos estados e municípios, por meio dos órgãos conhecidos como "Daspinhos": Departamentos Administrativos dos Estados e Departamentos das Municipalidades. Estes últimos se originaram de Departamentos de Assistência aos Municípios instituídos após a Revolução de 30, como instrumento de intervenção do Estado nas finanças municipais e na gestão municipal.(16)

Na conjuntura pós-Estado Novo, esse tipo de ingerência de um órgão federal nas instâncias sub-regionais de governo inviabilizou-se politicamente. A reforma administrativa patrocinada pelo DASP pôde ter continuidade apenas na administração pública federal. Na nova conjuntura - balizada pela constituição descentralizante de 46 e pela campanha municipalista - a única alternativa possível para a modernização administrativa dos municípios envolveria uma entidade de caráter privado, à qual os municípios poderiam recorrer voluntariamente. Como assinalado, a resistência à Fundação dos Municípios e o formato organizacional assumido pelo IBAM podem ser entendidos nessa perspectiva.

Para a elite burocrática vinculada à campanha municipalista, o "verdadeiro municipalismo (...) não constitui uma finalidade em si, apesar da opinião em contrário de alguns patriotas delirantes" (Vianna,1960).(17) O objetivo do municipalismo é pragmático: a reforma administrativa a nível local. Essa reforma compreenderia objetivos múltiplos e abrangentes, a serem perseguidos através de atividades de assistência técnica: ampliação das bases fiscais dos municípios; elaboração de cadastros fiscais; instituição do sistema de mérito na política de pessoal; criação de planos de cargos e salários; racionalização administrativa; organização e métodos na administração municipal; implementação de modernos procedimentos e técnicas de elaboração e controle orçamentário e de prestação de contas; e racionalização da provisão de serviços urbanos.

A consolidação do IBAM, enquanto agência urbana, teve como contrapartida o enfraquecimento de seus laços com a ABM. Esses laços se romperão formalmente quando o estatuto do IBAM for reformulado, em 1959, e a ABM perder a prerrogativa de indicar quatro membros de seu conselho consultivo. A consolidação do IBAM e seu progressivo afastamento em relação ao ruralismo está associado com o programa de cooperação técnica em administração pública criado no âmbito do Point Four (USAID), e, em menor medida, com as Nações Unidas. É no quadro dessas démarches de cooperação que Diogo Lordello de Mello, assessor da Associação de Municípios do Paraná, se especializou em administração urbana na University of Southern California. Com sua contratação como diretor assistente para o IBAM abriram-se as perspectivas de criação de uma linha de atuação distinta do municipalismo ruralista. Lordello, figura que veio a se tornar lendária na área da administração municipal no Brasil, passou a difundir técnicas modernas de gestão municipal no país.(18) O apoio financeiro da USAID e a articulação com Gerald Hardy, consultor em administração urbana da Comissão Consultiva de Administração Pública, criada no âmbito do Point Four, foram instrumentais para a viabilização do novo órgão.(19)

Ao longo da década de 50, e sobretudo na de 60, o IBAM passou a envolver-se em atividades de consultoria, principalmente em projetos de administração de sistemas de abastecimento de água e de cadastramento municipal. Em 1963, o IBAM contou com um contrato da USAID para a administração de sistemas de abastecimento de água da Fundação Serviços Especiais de Saúde Pública, e com um contrato de treinamento de técnicos venezuelanos, viabilizado pela USAID. A consolidação do perfil urbano do IBAM efetivou-se em 1966, quando, com apoio da Ford Foundation, foi criado seu Centro de Estudos e Pesquisas Urbanas. Para atrair e popularizar seu programa de trabalho, o IBAM passou a promover, a partir de 1954 e com a revista O Cruzeiro, o concurso anual dos cinco municípios de "maior progresso" do país. Baseado na experiência da National Municipal League americana e da revista Look, o concurso passou a contar com o apoio da USAID-Point Four em 1956. Nesse movimento, o IBAM inaugurou no Brasil a cultura da eficiência na esfera municipal.(20)

Como amplamente discutido na literatura especializada, a emergência do planejamento urbano enquanto campo de intervenção do Estado esteve, num primeiro momento, associada a intervenções urbanísticas de remodelação urbana e a ideologias estéticas e de higiene em grandes cidades.(21) Em um segundo momento, a estruturação desse campo de intervenção estatal está associada à questão da gestão urbana. De menor visibilidade, e talvez por isso menos conhecida, a modernização da gestão constitui uma dimensão central da expansão da esfera pública - vale dizer, da construção do moderno Estado brasileiro. O projeto de modernização da gestão municipal tinha como paradigma histórico a reforma municipal americana da Progressive Era (1900-1914). O projeto de reforma de gestão nos EUA buscava isolar a burocracia dos governos locais da influência das political machines. Entre suas principais inovações está a criação de um executivo municipal técnico, o city manager - em lugar de um comitê de vereadores das machines. A reforma, portanto, buscava revolucionar a cultura política americana do século XIX, dominada, como a brasileira, por forte clientelismo e patronagem. A reforma foi fundamental na construção da esfera pública e da "capacidade de Estado" nos EUA (Skowronek, 1982). O caso brasileiro se diferencia do americano, porque a reforma administrativa nos EUA teve mais sucesso nos níveis estadual e municipal do que no federal (Schiels, 1977). O projeto do DASP, como assinalado, se restringiu, em larga medida, à área federal.

Os casos americano e brasileiro se diferenciam fundamentalmente, na realidade, por dois fatores macrossociais que têm importantes conseqüências para o sucesso de reformas que visam à eliminação da patronagem. Em primeiro lugar, no caso americano tratava-se literalmente de construir uma burocracia pública profissionalizada cuja emergência, enquanto ator coletivo, ocorreu após a consolidação dos partidos políticos e da democracia de massas. No caso brasileiro - à semelhança dos casos francês e alemão - a emergência de uma burocracia profissionalizada precedeu historicamente a emergência dos partidos, seqüência que favoreceria, segundo Shefter (1978), a constituição de uma esfera pública racionalizada. No Brasil, essa burocracia que se consolidou durante o Império restringia-se, no entanto, ao poder central (Carvalho, 1980) e, mais importante, foi desarticulada com a transição para a República Velha. A questão assim não era a de criar uma burocracia pública como nos Estados Unidos - a partir do zero -, mas de reformar uma estrutura patrimonialista.

O paradigma americano de reforma municipal inspirou o padrão de intervenção do Estado na questão municipal do Estado Novo à década de 50. Esse paradigma passou ao largo da influência do urbanismo moderno preconizado pelos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (CIAM) e do movimento city beautiful, que influenciaram os círculos de arquitetos e urbanistas brasileiros. A influência do paradigma americano pode ser encontrada na década de 30, no Instituto Politécnico do Rio de Janeiro, na Escola de Engenharia de São Paulo e, sobretudo, no Instituto de Organização Racional do Trabalho (IDORT) em São Paulo. O IDORT promoveu, em 1936, a Jornada da Organização Científica na Administração Municipal, que divulgou amplamente as reformas americanas.(22) Entre os municipalistas históricos - que eram sobretudo juristas e especialistas em administração pública - a influência desse paradigma é evidente pelas recorrentes referências positivas à reforma municipal americana e à figura do city manager (Duarte, 1942:1078; Carvalho, 1942:135-6; Medeiros, 1947:115;8; Medeiros, 1946b:127-40). Particularmente revelador da influência americana entre os municipalistas históricos é o fato de um de seus membros mais atuantes, Océlio de Medeiros, ter dedicado um livro (Medeiros, 1947) ao especialista americano em administração municipal, Donald Stone.

No pensamento urbanístico da década de 30, a influência americana se fez sentir sobretudo entre engenheiros.(23) Essa influência, no entanto, era restrita a comentários especializados sobre as reformas das grandes cidades brasileiras, não logrando um impacto significativo na mudança do padrão de gestão municipal no país. Esse projeto, na realidade, esteve associado ao IBAM e à influência do movimento Economia e Humanismo chefiado pelo padre e economista francês Louis Lebret (Lamparelli, 1993). O IBAM, como também o IBGE e o DASP, do qual deriva, inauguram uma cultura organizacional pública, centrada na estatística e no orçamento e legitimam um "saber moderno" (Schwartzman, 1987) - a administração municipal - como campo disciplinar. É nesse movimento que se dá o deslocamento da engenharia municipal no sentido da administração municipal. O grupo do padre Lebret, em contraste, introduz no planejamento urbano e regional a problemática do desenvolvimento econômico e social. Enquanto o impacto do IBAM era difuso e anônimo - a clientela de prefeitos interioranos que se formou na leitura do famoso Manual do Prefeito -, o movimento de Economia e Humanismo contribuiu para a formação de uma elite reformista de especialistas em planejamento. São, portanto, matrizes distintas que informaram propostas específicas de modernização urbana.

Pode-se afirmar que o relativo insucesso do projeto de mudança na gestão municipal no Brasil, que permanece essencialmente patrimonialista até o presente, guarda equivalência com o malogro do agrarismo modernizador, ao qual se filia historicamente. Este último sucumbiu face às resistências das estruturas oligárquicas do campo. O conteúdo revolucionário de um projeto de modernização dos municípios dificilmente poderia ser exagerado: ele implicaria uma revolução profunda não só na cultura política, mas também no sistema político brasileiro. O malogro do projeto de mudança, no entanto, não foi absoluto. Nesse sentido, ele reflete a própria modernidade brasileira, inconclusa e desigual.(24)

Municipalismo, uma solução em busca de um problema?

O municipalismo, através da história brasileira, informou ideológica e programaticamente projetos fundamentais associados à modernização do país. De uma crítica à centralização política e à ausência de participação e representação, ele se associou à crítica autoritário-modernizante de cunho agrarista ao sistema sócio-político da República Velha que, no Estado Novo, enxergou no município o espaço plebiscitário e pré-político por excelência. Atingido o auge mobilizatório de sua trajetória durante a redemocratização do país na década de 40, o municipalismo se fissura em uma vertente política representada pela criação da ABM e uma vertente tecnocrática associada ao IBAM. Na primeira dessas vertentes o municipalismo perde seu caráter militante e se transforma numa frente nacional de políticos provincianos. Na segunda, o municipalismo perde seu caráter redentor e ruralista e adquire um caráter urbano-metropolitano.

Notas
            1. Tavares Bastos tornou-se o patrono oficial dos municípios brasileiros por projeto de lei apresentado pelo senador Jarbas Maranhão em 1952. Sua obra mais importante é A Província.
            2. "As relações entre um município brasileiro qualquer e a República Argentina são de interesse mais estreito do que as existentes entre os nossos municípios e estados; e não só com a República Argentina, senão com os EUA e, em menor escala, com todos os outros países que nos exportem produtos de alimentação" (TORRES, 1978:146). Para uma antecipação da crítica estado-novista ao municipalismo abstrato da Constituição de 1891, cf. NUNES, 1920.
            3. Esse tema constitui uma das questões centrais da historiografia brasileira sobre a Revolução de 30 e exigiria mais espaço do que o disponível para um tratamento adequado. Cf., entre muitos outros CAMARGO, 1981, A Revolução de 30, 1981, tomo I, e DRAIBE, 1985. Para uma fina análise das raízes agrárias da modernização brasileira, cf. REIS, 1979.
            4. No projeto de criação de um Partido Nacionalista Radical, por exemplo, reiterava-se que "o Brasil, país agrícola, por fatalidade de suas condições geológicas, tem vivido, na verdade, uma vida falsa (...) Ela criou uma questão social prematura para um povo jovem. Originou o contraste entre cidades brilhantes e vastos interiores miseráveis". Arquivo Osvaldo Aranha, transcrito em A Revolução de 30, tomo II, p. 145.
5. Para os processos de state building e nation building com referência ao caso brasileiro, cf. MERQUIOR, 1986 e os ensaios de Elisa Reis e Angela Gomes in BOSCHI, 1991.
6. Conferir entre muitos outros: SILVA, 1945; AMARAL, 1940; MOTA FILHO, 1940; ANDRADE, 1941; CARVALHO, 1941 a; 1941 b; PRAZERES, 1941 a; 1941b; DUARTE, 1942; MEDEIROS, 1946a. Cf. também CARVALHO, 1937, texto que foi posteriormente apresentado como tese oficial do governo brasileiro no II Congresso Interamericano de Municípios, em Santiago, em 1941.
7. Francisco Campos, citado em ANDRADE, 1941.
8. Reproduzido nos números de Revista Brasileira de Municí pios, 1947.
9. A expressão é de MOREIRA, 1946.
10. Medeiros, um dos expoentes do movimento, insistia para que os órgãos de assistência técnica não fossem "confiados a amadores ou políticos profissionais, interessados no poder político dos municípios, e sim a técnicos, capazes de imprimir aos mesmos uma orientação eminentemente gerencial e, na medida do possível, quase completamente apolítica". E concluía: "é preciso reconhecer que as municipalidades constituem, presentemente, problemas mais de management do que de política" (MEDEIROS, 1948:117). Cf. também MEDEIROS, 1946. Para a atuação e idéias de Xavier, cf. XAVIER, 1948; 1950; 1951; DELORENZO NETO, 1957; BURKINSKI; 1951. É no quadro dessa intensa discussão sobre o município que Victor Nunes Leal escreve Coronelismo, enxada e voto, sugestivamente subtitulado O município e o regime representativo no Brasil. Cf. LEAL, 1948.
11. "O Instituto Brasileiro de Administração Municipal. Aos Prefeitos e Vereadores", Revista do Serviço Público, III, 1952:158. O IBAM reproduz seu ideário municipalista, onde reitera seu caráter apartidário e técnico na primeira página dos números de Notícias Municipais (1956), publicação que depois foi intitulada Revista de Administração Municipal.
12. Para o processo de criação da EBAP consultar CARVALHO, 1968 e também ANDERSON, 1987. O acordo de cooperação envolvia o treinamento de 646 técnicos brasileiros em administração pública (60 dos quais em administração municipal), na vinda de 15 especialistas americanos e , em sua terceira etapa (1960-1964), o treinamento de 45 técnicos e docentes brasileiros na University of Southern California.
13. A denominação Operação dada ao plano era comum no período e também foi utilizada para designar o projeto inicial da SUDENE (Operação Nordeste), cf. Jarbas Maranhão, entrevista ao autor. Sobre a operação município, cf. MARANHÃO, 1960; GOMES, 1955; MEDEIROS, 1956; CAVALCANTI, 1959.
14. "Recomendação relativa ao Plano Nacional de Obras e Serviços Municipais, aprovada no III Congresso Brasileiro de Municípios", in Maranhão, 1960:175.
15. Por suas peculiaridades, o municipalismo paulista adquiriu identidade própria e levou à criação da Associação Paulista de Municípios - que não tem paralelo em qualquer estado, pelo papel que veio a desempenhar na política estadual - e ao surgimento de fortes lideranças (como, por exemplo, Aniz Badra). Cf. também BUENO, 1957.
            16. Segundo CARVALHO, 1946, a criação pioneira do DAM em São Paulo resultou da pressão da Câmara Sindical de Corretores de Fundos Públicos de São Paulo face à inadimplência generalizada dos municípios paulistas: "os resultados obtidos despertaram a atenção do regime e a instituição-que facilitava também a tutela - foi imitada fora de São Paulo". O deputado paulista Macedo Soares - que, significativamente, logo depois se tornaria presidente do IBGE - apresentou ementa na constituinte de 34 facultando aos estados a criação dos DAMs, utilizando a experiência exitosa de São Paulo como argumento. A ementa foi aprovada após tramitação extremamente turbulenta e "em meio a inquietação generalizada": "em vão protestaram numerosos deputados, sugerindo o que depois se viu realizado, isto é, que o órgão seria um instrumento político nas mãos dos administradores estaduais" (CARVALHO, 1946:109-10; 11821; 124-6). Cf. também AZEVEDO, 1935 e CUNHA, 1947.
17. Vianna foi o introdutor da orçamentação moderna no Brasil, Cf. VIANNA, 1943. O papel do regime de 30 na introdução da contabilidade pública foi resumido por CARVALHO, 1941:75, de forma particularmente expressiva: "misturavam-se na antiga organização, (i.e. pré-30), esferas de atividade que deveriam permanecer distintas, como a política, no sentido eleitoral, partidário, e a administrativa propriamente dita; não havia, por isso mesmo, uma contabilidade pública municipal, que era simples luxo burocrático, entregue aos personalismos".
            18. Para suas idéias no período formativo do IBAM, cf. MELLO, 1953, 1957 e 1960.
19. Para a estratégia de Hardy no sentido de consolidar a modernização dos municípios, cf. HARDY, 1956. Dentre os estudos realizados, cf. DONALD, 1959 e 1960.
20. Para uma análise do papel da burocracia pública brasileira na difusão de paradigmas internacionais de políticas públicas, cf. HOCHMAN, 1988.
21. Ver, entre muitas outras contribuições, o número especial "Cidade e História", da Espaço & Debates, n.° 34, 1991.
            22. Foram realizadas diversas jornadas ("Jornada Contra o Desperdício", "Jornada da Habitação Econômica" etc.). Cf. os números da Revista do IDORT (1932- ), que na década de 40 passa a ser intitulada Revista de Organização do Trabalho. Vale observar que a concorrência do IDORT no Estado de São Paulo evitou que o IBAM tivesse nesse estado a mesma penetração que veio a ter em todo o Brasil. Essa concorrência levou a diversos episódios de resistência ao trabalho do IBAM (PINTO, 1968:237-8). A cultura da eficiência municipal teve como veículo, na década de 70, a revista Dirigente Municipal.
            23. Este é o caso de Anhaia Melo, Armando Augusto de Godoy, Lincoln Continentino, Washington Azevedo e Baptista de Oliveira, entre outros. Godoy, autor do primeiro código de obras do Rio de Janeiro, por exemplo, afirma que para sua redação "se inspirou muito na célebre obra de Lawrence Veiller, The Model Housing Law". Cf. GODOY, 1943:320. Sobre o papel de Veiller no City Planning Movement, cf. TOPALOV, 1988:29-59. Para a penetração das idéias americanas, cf. CONTINENTINO, 1937; AZEVEDO, 1934 e 1935; OLIVEIRA, 1937; MARIANNO FILHO, 1930 e 1943; MELLO, 1929; MATTOS, 1952. Anhaia Mello e sobretudo Azevedo, que se formou em Harvard, destacam-se do grupo por seu profundo cosmopolitismo. Segundo AZEVEDO, 1931:151, Anhaia Mello havia lhe garantido "que a única fonte para estudos de urbanismo são os livros americanos". Sobre Mello, cf. LEME, 1991.
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Valdemar Lopes, ex-secretário geral do IBGE (décadas de 40 e 50).
Jarbas Maranhão, ex-senador (PSD-PE), autor do projeto de lei da Operação Município.
            24. Para o neomunicipalismo na Nova República, cf. MELO, 1993.
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O MUNICIPALISMO E A CULTURA POLÍTICA BRASILEIRA *

Otair Fernandes de Oliveira **

1 – Considerações Iniciais

Em um trabalho sobre a Câmara Municipal no atual contexto brasileiro sentimos a necessidade de ressaltar alguns aspectos relacionados a nossa cultura política institucional. A idéia era refletir sobre a base e a origem da formação social, política e institucional da sociedade brasileira. Pois a existência da Câmara como órgão da administração pública e de representação política, data desde os tempos coloniais, isto é, muito antes das Assembléias estaduais e do próprio Congresso Nacional. Herdada dos colonizadores portugueses, a instalação de Câmaras locais era fator obrigatório para a formação e o reconhecimento do município (Vilas) por ato da "autoridade régia" [1]. Salvo em raríssimo momento, o estímulo para a instalação de Câmaras locais não buscava a autonomia, mas a subordinação do município, pois este era submetido, como braço administrativo, à centralização monárquica [2].
Como um dos primeiros órgãos de administração pública e de representação política no país, a Câmara Municipal, ao nosso ver, constitui a base da vida pública brasileira compondo suas primeiras estruturas políticas em um país colonizado, cujas trajetórias e evolução histórica das suas instituições políticas se reportam aos avanços e retrocessos da sua história em direção à centralização ou à descentralização política, à autonomia ou limitação de autonomia das instituições e à aproximação ou ao afastamento do experimento democrático. Acreditamos que, uma vez explicitada, esta estrutura política local pode revelar aspectos importantes do conteúdo político-institucional que têm permeado as instituições políticas ao longo dos tempos.
Nossa intenção é destacar alguns traços característicos da vida institucional brasileira, tendo como referência certa literatura clássica sobre a política nacional, notadamente as obras Instituições Políticas de Oliveira Vianna, Os Donos do Poder de Raymundo Faoro e Coronelismo, Enxada e Voto de Victor Nunes Leal.
Partimos do pressuposto de que alguns traços culturais característicos da forma de pensar e de fazer política no país têm permanecido inalterados ou sofreram mínimas modificações ao longo dos tempos, persistindo no comportamento político institucional de hoje. Mesmo considerando as alterações sofridas na morfologia institucional brasileira com o recente processo de redemocratização vivenciado no país, sobretudo, dos órgãos legislativos, no caso investigado a Câmara dos Vereadores, esses traços são reproduzem práticas políticas tradicionais que podem funcionar como freio ou limites para possíveis avanços em prol do aprimoramento e aperfeiçoamento institucional na direção da consolidação de uma vida democrática. Mas, quais são essas características?

2 - Oliveira Vianna e a Ausência do Espírito Público

Um dos primeiros traços característicos da nossa cultura política consiste no problema da ausência ou carência de “motivações coletivas” ou a falta do “espírito público” nas instituições políticas brasileiras, apontado por Oliveira Vianna na sua interpretação desenvolvida na obra “Instituições Políticas Brasileira” (1974), onde enfatiza os fundamentos sociais e políticos da formação do Estado brasileiro.
Partindo de uma análise com um viés chamado pelo próprio autor de “culturológico”, tendo como base as estruturas políticas municipais Vianna investiga os antecedentes históricos e a "influência subconsciente dos usos e costumes tradicionais da nossa vida local". Ressalta o que ele próprio denomina de “fracasso ou inexecução das instituições políticas vindas de importação ou de pura inspiração ideológica”, e, ainda, salienta as dificuldades para a implantação das instituições democráticas liberais no país, quando afirma que “não era fácil impor-se a um povo uma nova modalidade de comportamento político” [3].
Como traço principal da cultura política brasileira, Vianna destaca o “privatismo” e o “personalismo”, formadores de uma psicologia política, parte das heranças coloniais e da tradição do subconsciente coletivo do país desde os primórdios da nossa história e que subsistem nas estruturas locais, envolvendo as "elites superiores", interferindo na formação e no funcionamento dos governos provinciais e do Império.
Nesse caminho, o motivo privado ou privatista se constituía na marca da disputa pela conquista do poder municipal. Motivo identificado com o interesse pessoal dos “chefes de clãs”, uma vez que essa motivação consistia na força inspiradora dos “clãs eleitorais”, formadores dos partidos políticos, vistos como “simples organizações de interesse privado com funções no campo político”. Assim esse poder era disputado, segundo o autor:

“Não para que realizassem qualquer interesse geral e público das localidades (municípios); mas, apenas como meio de prestígio, de orgulho, de realce pessoal, ou de defesa contra os adversários locais” [4].

Essa situação consistia na ausência da compreensão do poder do Estado como órgão do interesse público, quando na formação do Império e da ordem constitucional, constituindo um problema para a instalação e consolidação do regime democrático no país.

Reside aí, segundo Vianna, o nosso “grande mal”, posto que “os órgãos do Estado são para estes chefes de clãs, locais ou provinciais, apenas uma força posta à sua disposição para servir aos amigos e aos interesses, ou para oprimir os adversários e os interesses destes” [5].
         Na opinião do autor, esse comportamento político herdado desde a Colônia não sofreu profundas alterações até a fundação do Império. Com isso, ele identifica outra característica das nossas instituições políticas, que se refere à contradição existente entre o legal e o comportamental ou costumeiro, ou seja, à questão de que os textos constitucionais brasileiros (1824, 1891 e 1934) inspirados externamente são contrastantes com a nossa cultura política. Daí, afirmar a impossibilidade prática de se instalar no Brasil um Estado Nação no “puro estilo inglês ou americano”, assentado sobre “bases populares e democráticas”. Nesse sentido, o município é visto como a primeira estrutura local do novo Estado Nacional de base democrática, que o autor identificava no Império brasileiro.
Outra característica da vida pública institucional destacada por Vianna refere-se à ausência de educação política das nossas instituições, compreendida como a falta de preocupação das instituições brasileiras em se organizar e desenvolver uma educação “democrática ou de liberalismo prático”, pois:

“... nos grandes domínios da Colônia e do Império, debalde procuramos qualquer instituição pública - qualquer sistema econômico, ou religioso, ou administrativo, ou jurídico, ou político - que importasse na iniciação ou preparação do nosso povo-massa para a vida democrática, isto é, para sua direta intervenção nas gestões da coisa pública local; menos ainda - da coisa pública provincial; muito menos ainda - da coisa pública nacional. De qualquer uma delas o nosso povo-massa esteve sempre - seja legalmente, seja praticamente - ausente durante todo o curso da nossa história política e administrativa; isto é, durante cerca de 400 anos” [6].
       
         No entanto, ao contrário do que muitos possam imaginar, não é na formação política do “povo-massa” para uma intervenção direta na vida pública que o autor acredita e defende para o país. Para além de uma visão de história temporal e cronológica que coloca a história do Brasil à imagem e semelhança do desenvolvimento histórico europeu, as bases teóricas do pensamento de Oliveira Vianna estão relacionadas à influência dos argumentos darwinistas da seleção natural, segundo os quais os fatores biológicos, genéticos, determinam a formação e os atributos culturais do ser humano. Tais argumentos constituem a base do pensamento elitista, conservador e racista predominante no país e no mundo ocidental à época da formação do Estado-Nação brasileiro [7]. Isso não tira o mérito teórico de que, em relação ao comportamento político institucional no país, o autor tenha levantado aspectos importantes.

3 - Raymundo Faoro e o Estamento Burocrático

         Aos traços ressaltados por Vianna, somam-se os destacados por Raimundo Faoro em “Os Donos do Poder” (1976), obra com interpretação histórico-crítica da formação social brasileira. Por meio do que é chamado de “estamento burocrático”, Faoro revela a contradição entre o processo de modernização do país, cujas bases são instituições “anacrônicas” e comandadas por um “estamento burocrático”. Este funda-se num sistema patrimonial do capitalismo politicamente orientado, que nem mesmo a pressão da ideologia liberal e democrática conseguiu quebrar, diluir ou desfazer.
         O autor ressalta a persistência de uma estrutura patrimonial, assentada no tradicionalismo, transplantado para a Colônia pelos portugueses, que aqui se consolidou e se adaptou às mudanças políticas da história nacional [8]. Tradicionalismo que, segundo ele, aqui se reproduziu na formação dos primeiros órgãos da administração colonial (Câmaras ou Senado da Câmara), com base em um sistema eleitoral restrito e restringido na seletividade dos chamados “homens bons” para a composição da máquina administrativa [9].
Por “estamento burocrático”, Faoro identifica um “quadro administrativo e estado-maior de domínio característico do patrimonialismo, em que uma minoria comanda, disciplina e controla a economia e os núcleos humanos” [10]. Num estágio inicial, esse tipo de domínio se apropria das oportunidades econômicas de desfrute dos bens, das concessões, dos cargos, confundindo o setor público com o privado, que, com o aperfeiçoamento da estrutura política, se fixa com divisão dos poderes.
Essa característica, segundo o autor, tem atravessado toda a história política brasileira, que, no caso da ausência do “quadro administrativo”, a chefia dispersa e assume caráter patriarcal, identificável no mando da pessoa do fazendeiro, do senhor de engenho e dos coronéis. Quando se estrutura, o patrimonialismo pessoal se converte em patrimonialismo estatal, devido ao fato de que:

“... o patrimonialismo se amolda às transições, às mudanças, em caráter flexivelmente estabilizador do modelo externo, concentrando no corpo estatal os mecanismos de intermediação, com suas manipulações financeiras, monopolistas, de concessão pública de atividade, controle de crédito, de consumo, de produção privilegiada, numa gama que vai da gestão direta à regulamentação material da economia” [11].

         Além disso, Faoro chama a atenção para o fato de que esse tipo de “estamento burocrático” se perpetua como uma camada social sobre a sociedade, posicionando-se acima das classes sociais. Tal camada é configurada num estrato social, é comunitária, mas nem sempre articulada, muitas vezes amorfa, constitui o aparelhamento político "que impera, rege e governa em nome próprio, num círculo impenetrável de comando". Ela muda e se renova, "(...) substituindo moços por velhos, aptos por inaptos, num processo que cunha e nobilita os recém-vindos, imprimindo-lhes os seus valores".
         Nesse sentido, o “estamento burocrático” com aparelhamento próprio invade e dirige a esfera econômica, política e financeira, comandando o ramo civil e militar da administração. No âmbito político, interno à estrutura, o quadro de comando se centraliza, pretendendo “se não a coesão monolítica”, ao menos a “homogeneidade de consciência, identificando-se às forças de sustentação do sistema”.
Na peculiaridade histórica brasileira, segundo a interpretação de Faoro, essa camada dirigente atua em nome próprio, servida dos instrumentos políticos derivados de sua posse do aparelhamento estatal. Na opinião do autor, o impacto das novas forças sociais tem sido amaciado, domesticado e transformado por essa camada dirigente, que incorpora seus próprios valores, mesmo, às vezes, adotando uma ideologia diversa, mas compatível com seu esquema de domínio. Dessa forma, ele afirma:

"O poder - a soberania nominalmente popular - tem donos, que não emanam da nação, da sociedade, da plebe ignara e pobre. O chefe não é um delegado, mas um gestor de negócios, gestor de negócios e não um mandatário. O Estado, pela cooptação sempre que possível, pela violência se necessário, resiste a todos os assaltos, reduzido, nos seus conflitos, à conquista dos membros graduados de seu estado-maior" [12].

         Esse conteúdo institucional, segundo Faoro, tem moldado a fisionomia do chefe do governo. Este é gerado e limitado pelo quadro que o cerca (o rei, o imperador, o presidente). Assim, o chefe governa o estamento e a máquina que regula as relações sociais. Dessa maneira:

“(...) o chefe provê, tutela os interesses particulares, concede benefícios e incentivos, distribui mercês e cargos, numa atmosfera que dele se espera que faça justiça sem atenção às normas objetivas e impessoais” [13].

         Esse sistema é compatível com uma ordenação formalmente jurídica (órgãos estatais separados, assembléias ou tribunais) e pode conviver com um constitucionalismo formal, nominal, em que a Carta Magna tem validade jurídica, mas não se adapta ao processo político e não alcança capacidade normativa, “adulterando-se no aparente constitucionalismo”[14].
         Nessa situação, “a soberania popular não existe, senão como farsa, escamoteação ou engodo”, pois a autocracia pode operar sem que o povo perceba seu caráter ditatorial, “salvo em momentos de conflitos e de tensões, quando os órgãos estatais e a carta constitucional cedem ao real, verdadeiro e atuante centro do poder político”.

         Por outro lado, o autor ressalta a incompatibilidade desse tipo de sistema autocrático e autoritário com o que ele considera “sistema normativamente constitucional e democrático”, pois este tipo de estrutura tem como essência o fato de que “os detentores do poder participam na formação das decisões estatais, mediante mecanismos de controle que atuam na participação popular” [15].
         Conforme essa interpretação de Faoro, o Brasil convive “com duas partes desacreditadas e opostas que navegam para pontos antípodas: a sociedade e o estamento”. Os processos de modernização, em todos os níveis, desde a transmigração da família real têm ocorrido de “cima para baixo" sob o pressuposto da “incultura”, senão da “incapacidade do povo”. Assim, ao povo resta oscilar entre o parasitismo, a mobilização de passeatas sem participação política e a nacionalização do poder, ficando mais preocupado com os “novos senhores”, com o “bom príncipe”, dispensários de justiça e proteção. “A lei, retórica e elegante, não o interessa [ao povo]. A eleição, mesmo formalmente livre, lhe reserva a escolha entre opções que ele não formulou” [16].

4 - Victor Nunes Leal e o Fenômeno do Coronelismo

         O conjunto das características destacadas tanto por Vianna quanto por Foaro refere-se aos fatores macroinstitucionais da política nacional, sob o ângulo de aspectos mais abrangentes do nosso comportamento político-institucional. A esses, acrescentam-se e complementam-se as observações de Victor Nunes Leal em “Coronelismo, Enxada e Voto” (1986), que oferece um estudo mais aprofundado do quadro da vida social e política brasileira, tendo como base os municípios do interior, predominantemente rurais. Tal estudo possibilita uma visão microinstitucional da nossa vida pública.

         Segundo o autor, o fenômeno do “coronelismo” é o principal traço característico do regime republicano, apesar da percepção originária de diversos elementos que o compõem no regime colonial, pois ele consiste num sistema político de compromisso entre o poder público e o poder privado, tendo como base de sustentação econômica uma estrutura agrária decadente. Nesse sentido, para o autor, conceitualmente, “(...) o ‘coronelismo’ é sobretudo um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais, notadamente, dos senhores de terras”[17].
         Esse compromisso reside num certo grau de fraqueza de ambos os lados, principalmente do poder público, que, diante da debilidade de constituir-se frente ao alargamento do regime representativo por meio da ampliação do sufrágio, incapaz de exercer a plenitude das suas funções, compõe-se com o poder privado dos donos de terras. Desse modo, segundo Leal,

"A superposição do regime representativo, em base ampla, a essa inadequada estrutura econômica e social, havendo incorporado à cidadania ativa um volumoso contingente de eleitores incapacitados para o consciente desempenho de sua missão política, vinculou os detentores do poder público, em larga medida, aos condutores daquele rebanho eleitoral. Eis aí a debilidade particular do poder constituído, que o leva a compor-se com o remanescente poder privado dos donos de terras no peculiar compromisso do 'coronelismo” [18].

         A situação de dependência do eleitorado rural (massa de assalariados, parceiros, posseiros e pequenos proprietários) em relação aos donos de terras e à falta de consciência política dos eleitores faz, segundo o autor, com que o coronelismo se estabeleça num sistema de reciprocidade, de “troca de favores” entre os políticos locais e o poder público estadual. De um lado, os chefes municipais e os coronéis conduzem uma quantidade de eleitores, de outro lado, a situação política dominante no Estado, “que dispõe do erário, dos empregos, dos favores e da força policial, que possui, em suma, o cofre das graças e o poder da desgraça” [19].
         Assim, para Leal, o advento da República, sob as bases do regime federativo e a eleição do governo do Estado, repousa no compromisso coronelista facilitador da  “montagem, nas antigas províncias, de sólidas máquinas eleitorais (...) estáveis, que determinaram a instituição da ‘política dos governadores’”[20]. Portanto, o governo estadual constituía a parte forte desse compromisso consolidado por meio do uso do poder público para fins de política partidária.
         Nesses termos, o autor afirma que a essência do compromisso coronelista consiste no incondicional apoio aos candidatos do oficialismo nas eleições estaduais e federais, pela parte dos chefes locais. Da parte do governo estadual, é dada carta branca ao chefe local governista (de preferência ao líder da facção majoritária) referente a todos os assuntos relativos ao município, inclusive para a nomeação de funcionários estaduais do lugar. Com isso, os dirigentes políticos locais, direcionando seus votos para os candidatos governistas, tornam-se credores de especial recompensa, que consiste em ficarem com as mãos livres para consolidarem sua dominação no município.
         Diferentemente de uma visão negativa do sistema político brasileiro, depreendida subjacentemente nas idéias concebidas por Vianna de “privatismo ou da ausência do espírito público” ou nas idéias de Faoro, de um “estamento burocrático”, Victo Nunes Leal não vê o coronelismo de todo negativo, uma vez que salienta os aspectos positivos do sistema coronelista, argumentando que muitos melhoramentos nas localidades devem-se ao interesse e à insistência do chefe político local. Construções de escolas, estradas, correio, ferrovia, posto de saúde, hospital, luz elétrica, rede de esgoto, água encanada, campos de futebol, dentre outros, “exigem o esforço, muitas das vezes penosos, chegando até ao heroísmo desse chefe político local”. Assim, na sua opinião, “é um erro supor que o chefe local procede por meio de capricho, sem idealismo e sem espírito público”, pois

“É com essas realizações de utilidade pública, algumas das quais dependem só do seu empenho e prestígio político, enquanto outras podem requerer contribuições pessoais suas e dos amigos, é com elas que, em grande parte, o chefe municipal constrói ou conserva sua posição de liderança”[21].

         Nesse momento, Leal identifica o “espírito governista” como a marca predominante da mentalidade da política municipal, pois, ao apoiar o governo estadual, o chefe local obtém para o seu município as melhorias julgadas por ele necessárias e urgentes. Também identifica uma “ética especial” desse tipo de relação, que consiste no fato de que “os compromissos não são assumidos à base de princípios políticos, mas em torno de coisas concretas”, prevalecendo para uma ou para poucas eleições[22].
         De acordo com isso, o paternalismo por intermédio do “favor pessoal” torna-se um importante instrumento de dominação política, transformando favores de toda ordem, tais como a concessão de empregos, empréstimo ou financiamento de dinheiro, contratação de advogado, providenciamento de médico ou hospitalização, apadrinhamento ou batismo de filhos ou de casamentos, legalização de terras e muitos outros; em realizações concretas dos préstimos pessoais que dependem direta ou indiretamente da pessoa do chefe local.
         Nesse tipo de favorecimento, em muitas vezes, não há fronteiras e nem barreiras entre o que é ou não legal, pois “para favorecer os amigos, o chefe local resvala muitas vezes para a zona confusa que medeia entre o legal e o ilícito, ou penetra em cheio no domínio da delinqüência, mas solidariedade partidária passa sobre todos os pecados uma esponja regeneradora”[23].

         Numa contraface desse tipo de sistema de compromisso, Leal identifica o “filhotismo” e o “mandonismo”. O primeiro reside no favoritismo em relação aos amigos do governo, com fechamentos dos olhos para as mazelas de seus apadrinhados políticos, contribuindo, assim, para a desorganização da administração municipal, sob a “vista grossa” dos governos estaduais, ainda mais quando se considera o despreparo técnico dos parentes e amigos e a utilização do dinheiro, dos bens e dos serviços do governo municipal nas campanhas eleitorais, entendidas como verdadeiras “batalhas eleitorais”. Já o "mandonismo" se manifesta na perseguição aos adversários da situação, num permanente clima de hostilidade.
         Dessa maneira, tanto o “favor” quanto o “porrete”, segundo o autor, são os recursos utilizados pelo chefe local na manutenção do seu domínio político, daí a subexistência de expressões no meio político, tais como: “para os amigos pão, para os inimigos pau” ou “aos amigos se faz justiça, aos inimigos se aplica a lei” [24].
         Com tudo isso, é possível resumir as principais características "coronelistas" como sistema de compromisso, da seguinte forma:
a) utilização do dinheiro, dos serviços e dos cargos públicos, como processo usual de ação partidária;
b) prática de falseamento do voto, influenciada pela precariedade das garantias da magistratura e do ministério público (ou sua ausência) e a livre disponibilidade do aparelhamento policial;
c) submissão do município frente à preponderância da situação estadual em seus entendimentos com os chefes locais;
d) favoritismo em relação aos amigos do governo e forte cobrança ou retaliações em relação aos adversários.

         A questão fundamental nesse sistema de compromisso, para Leal, trata-se da autonomia municipal, pois, na sua opinião, “o verdadeiro problema não é o da autonomia dos municípios, mas o de falta de autonomia”, evidência constante em nossa história, devido ao amesquinhamento das instituições municipais que, salvo raras exceções, sempre estiveram submetidas à interferência régia, imperial e republicana. No entanto, paralelo a essa falta de autonomia legal, o autor ressalta que os chefes municipais governistas contavam com uma ampla autonomia extralegal. Dessa forma, afirma que:

“É justamente nessa autonomia extralegal que consiste a carta-branca que o governo estadual outorga aos correligionários locais, em cumprimento da sua prestação no compromisso típico do ‘coronelismo’. É ainda em virtude dessa carta-branca que as autoridades estaduais dão o seu concurso ou fecham os olhos a quase todos os atos do chefe local governista, inclusive a violências e outras arbitrariedades” [25].

         Embora Leal defenda que o “coronelismo” se assenta, por um lado, nas fraquezas dos donos de terras, que se iludem com o prestígio do poder, obtido à custa da submissão política, e, por outro lado, na desilusão daqueles que dependem das terras dos coronéis para sobreviverem, o compromisso coronelista não tem se enfraquecido com o fortalecimento do poder público e com a decadência da estrutura agrária no país, como se poderia esperar. Ao contrário, o fortalecimento do poder público tem “contribuído para consolidar o sistema, garantindo aos condutores da máquina oficial do Estado quinhão mais substancioso na barganha que o configura. Os próprios instrumentos do poder constituído é que são utilizados, paradoxalmente, para rejuvenescer, segundo linhas partidárias, o poder privado residual dos ‘coronéis’ (...) [ que subsiste], se adapta, aqui e ali, para sobreviver, abandonando os anéis para conservar os dedos” [26].

         Alerta o autor que tal sobrevivência, no plano político, falseia a representação política e desacredita o regime democrático, permitindo e estimulando o emprego habitual da força pelo ou contra o governo. Daí o caráter metamorfoseador do fenômeno ressaltado na obra do autor.

5 – Considerações Finais

Diante das argumentações aqui abordadas, é perceptível que alguns desses traços característicos da vida político-institucional permaneçam e persistam de maneira inequívoca, no contexto atual, frente ao novo quadro político vigente no país. Mesmo considerando as divergências no plano teórico e metodológico e, principalmente, do ponto de vista ideológico entre os autores supracitados, no cômputo geral, pode-se chamar a atenção para três ordens de questões subjacentes aos aspectos gerais da cultura política das nossas instituições.
 A primeira ordem refere-se à relação entre o poder privado e o poder público, destacada nas idéias de privatismo e na falta ou carência de espírito público, no controle do poder político por uma minoria dirigente que atua em nome próprio, e em um sistema de compromisso e de troca de favores entre os donos de terras e o poder público, segundo Vianna, Faoro e Leal, respectivamente.
 A segunda ordem de questões diz respeito à contradição entre a morfologia institucional e a dinâmica comportamental das instituições e dos agentes políticos. Tal contradição é revelada por Vianna na idéia da discrepância entre a norma jurídica e a prática política; por Faoro, na contradição entre o moderno e o anacrônico das instituições políticas; e por Leal, na relação entre o legal e o ilícito ou extralegal.
 A terceira ordem de questões é de fundamental importância para uma melhor compreensão das dificuldades e obstáculos referentes ao processo de democratização no país. Trata-se dos problemas oriundos e decorrentes da formação e do funcionamento das instituições básicas da democracia liberal, referentes à participação política. Esses problemas são revelados, segundo Vianna, na falta de preocupação com a educação política do povo por parte das instituições; conforme, Faoro no pressuposto da incultura ou incapacidade da população e no desinteresse desta em participar politicamente; e por Leal, na dependência e ignorância política do eleitorado rural frente aos chefes políticos locais.
Mas, ao nosso ver, a questão atual de fundamental importância nas interpretações aqui abordadas, de maneira geral, trata-se dos problemas e das dificuldades da implantação e funcionamento da democracia no país, mesmo dentro dos moldes liberais. Em Oliveira Vianna, é clara sua visão pessimista quanto a isso, daí afirmar à impossibilidade prática de tal realização. Em Raimundo Faoro, a atenção é para o fato de ser possível o estamento burocrático conviver com a democracia formal do ponto de vista constitucional com validade jurídica, adulterando-se no aparente constitucionalismo. Em Victor Nunes Leal, o alerta é para a sobrevivência do sistema coronelista, que subsiste, se adapta e se molda às inovações e transformações da vida pública brasileira (metamorfose), impondo barreiras e limitações à democratização da sociedade, no conjunto de suas instituições e, com isso, falseando a democracia. Isso significa dizer que, mesmo nos tempos atuais, em um mundo predominantemente urbano com eleições eletrônicas e televisivas o fenômeno do coronelismo pode estar redefinido sob nova roupagem, conforme os padrões exigidos em um contexto de democratização.
Tais considerações remetem a uma reflexão profunda sobre as características e as formas de democratização do Estado e da sociedade brasileira ora em vigências. Servem como um alerta para o fato de que a realização da democracia na sua forma legal e normativa não é capaz e nem suficiente para a garantia da consolidação de um  regime democrático no país. Essa normatividade constitui um ponto de partida necessário à formulação de mecanismos legais que precisam ser efetivados e consolidados no conjunto das práticas político-institucionais. É fato que alguns desses mecanismos estão subscritos no arcabouço constitucional vigente, e sua efetivação depende do compromisso e das responsabilidades assumidas pelas instituições políticas refletidos nas atitudes e comportamentos dos seus membros, a quem cabe a tarefa principal de evidenciar a importância dos valores do experimento democrático. O fato é que nossa experiência nesta direção é incipiente. Daí torna-se fundamental o aprimoramento e o aperfeiçoamento das instituições políticas existentes em prol do exercício e do cumprimento dos preceitos legais ora vigentes no país, mesmo que esses preceitos ainda necessitem de melhores formulações.

Bibliografia

FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder: formação do patronato político brasileiro. 3ª ed. ver. Porto Alegre: Globo, 1976. V. 1, Cap. XIV, p. 579-749: República Velha -Os Fundamentos Políticos.
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto: o município e o regime representativo no Brasil. 5ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1986. 276p.
LIMA JÚNIOR, Olavo Brasil de. Instituições Políticas Democráticas: o segredo da legitimidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997. 143p.
MOISÉS, José Álvaro. Os Brasileiros e a Democracia: bases sócio-políticas da legitimidade democrática. São Paulo: Ática, 1995 (Ensaios 142). 301p. Cap. 3, p. 82-101: Democratização e Cultura Política.
RODRIGUES, Alcides Redondo  et al. O Vereador e a Câmara Municipal. Rio de Janeiro: IBAM, 1997. 132p.
TAVARES, Iris Eliete T. N. de P. O Município Brasileiro: sua evolução histório-constitucional. Revista Brasileira de Estudos Políticos (UFMG), Belo Horizonte, n.º 86, p. 85-115, jan, 1998.
VIANNA, Oliveira. Instituições políticas brasileira – Fundamentos sociais do Estado: Direito Público e cultura. 3ª ed. Vol. 1. Rio de Janeiro: Record, 1974

Notas

[1] Segundo Diogo Lordello de Mello, a primeira Câmara instalada no Brasil foi no ano de 1532 em São Vicente, São Paulo. Ver "A Representatividade das Câmaras Municipais". In: RODRIGUES et al (org.). O Vereador e a Câmara Municipal. 1997.
[2] Segundo Raimundo Faoro, no início da colonização eram amplas as atribuições das Câmaras e o poder político local era entregue aos chamados “homens bons”, mas, depois de curto espaço de tempo com certa autonomia local, as Câmaras passaram a simples executoras das ordens superiores. Sua composição era de juizes ordinários e dos vereadores e outros funcionários (eletivos ou nomeados), sem uma distinção clara nas atribuições das autoridades, funções separadas, no que se refere à administração, justiça e legislativo, ou com respeito à esfera superior das capitanias. Havia eleições da Câmara que funcionavam como vínculo entre o povo e a administração pública, restringida a um corpo eleitoral reduzido aos “homens bons” (Conselho), confundidos com os proprietários de terras (indivíduos não nobres que possuíam hereditariamente a propriedade livre). Ver: FAORO. Os Donos do Poder. V. 1, 1976, p. 184.
[3] Op. cit., vol. 1, p. 311.
[4] Sobre as motivações privatistas, Ibid., p.273 et seq. Sobre os clãs eleitorais ver capítulo XI - Os "Clãs Eleitorais" e sua emergência no IV Século (Gênese dos partidos políticos), Ibid., pp. 242-257.
[5] O parâmetro de democracia de Oliveira Vianna é o modelo de democracia representativa de tipo liberal, tendo como referência  a Inglaterra e os Estados Unidos. Esse tipo de democracia se configura fundamentalmente pela vigência de uma Ordem Constitucional e a existência de eleições. A convivência com o trabalho escravo e a  limitação da participação política restrita a uma pequena minoria da população, como era no período imperial, não são fatores que aparecem no ideário democrático de Vianna como contraditório.
         Importante também lembrar que mesmo na democracia grega, base da cultura da cultura ocidental moderna, mulheres, crianças e escravos eram excluídos da participação política da pólis, isto é, não eram cidadãos.
[6]  Ibid., p. 293.
[7] O autor acredita na formação de uma elite nacional, como ele observa no Império (segundo reinado), "os homens de 1000". Elite, por ele admirada, "formada pela força de hereditariedades eugênicas combinadas", gestada e selecionada no seio do povo devido a sua individualidade superior e dotados organicamente, constitucionalmente de espírito público e de "espírito de serviço". "Homens, que D. Pedro II com sua visão panótica e a probidade do seu critério descobria no cenário da política e fixava nos grandes quadros da administração nacional...". Homens como Nabuco, Paraná, Vasconcelos, Uruguai, Itaboraí, Caxias e outros, "não eram grandes porque inspirados no povo-massa (...), não tinham evidentemente a inspiração popular; eram homens de moldagem carismática - homens formados pelo Imperador. Consciente ou subconscientemente, era deste a mensagem que traziam - e não do povo" (Ibid., p.313 et seq.).
[8] O "patrimonialismo" é visto como um tipo de domínio, de uma forma de poder institucionalizada, em que a comunidade política conduz, comanda, supervisiona os negócios, como negócios privados seus na origem e como negócios públicos depois. Faoro sustenta a idéia de que herdamos a estrutura do Estado patrimonial português, entendido como uma ordem burocrática, com o soberano sobreposto ao cidadão, na qualidade de chefe para o funcionário. "Na monarquia patrimonial, o rei se eleva sobre todos os súditos, senhor da riqueza territorial, dono do comércio - o rei tem um dominus, um titular da riqueza eminente e perpétua, capaz de gerir as maiores propriedades do país, dirigir o comércio, conduzir a economia como se fosse sua empresa" (op. cit., Vol. 1, p.20.). Maiores informações sobre o domínio patriarcal, ver  Vol. 1, capítulo I - Origem do Estado Português e Vol. 2, capítulo final - A Viagem Redonda: do patrimonialismo ao estamento.
[9] Sobre os homens bons, diz Faoro:“Na verdade, o escopo íntimo da superioridade institucional do homem bom será o mesmo que inspira os conselhos portugueses: inscrever os proprietários e burocratas em domicílio da terra, bem como seus descendentes, nos ‘Livros da Nobreza’, articulando-os, desta sorte, na máquina política e administrativa do Império. Incorporam-se, por meio da aristocracia por semelhança, as camadas novas de população, enobrecidas pelos costumes, consumo e estilo de vida. O complicado sistema eleitoral destila novas levas, autorizadas pela confiança local, ao estamento, cada vez mais burocrático na sua densidade”. Ibid., vol. 1, p.185.
[10] Ibid.,  p.203.
[11] Ibid., p. 736-738
[12] Ibid., p. 748.
[13] Ibid., p.739- 740.
[14] O sistema político de um governo tipo estamental, segundo o autor, é necessariamente característico de uma "autocracia de caráter autoritário", entendido como "uma organização política, na qual um único detentor do poder - uma só pessoa ou 'ditador', uma assembléia, um comitê, uma junta ou um partido - monopoliza o poder político sem que seja possível aos seus destinatários a participação real na formação da vontade estatal". Faoro destaca que o termo "autoritário" refere-se mais à estrutura governamental do que à ordem social. "O único detentor do poder político impõe à comunidade sua decisão política fundamental". Assim, o regime autoritário então, se satisfaz apenas com o controle político do Estado, sem, necessariamente, pretender dominar a totalidade da vida sócio-econômica da comunidade, ou determinar sua atitude espiritual de acordo com sua imagem (Ibid., p. 741).
[15] Ibid., p.741-2.
[16] Ibid., p.747 e 748.
[17] Op. cit., p. 20.
[18] Ibdem, p. 253.
[19] Ibid., p. 20-43.
[20] Ibid., p.253.
[21] Ibid., p. 37.
[22] Ibid., p.41.
[23] Ibid., p. 38-39.
[24] Ibid., p.38-39.
[25] A atrofia do município, segundo o autor, tem resultado de vários processos, como a penúria orçamentária, excesso de encargos, redução de suas atribuições autônomas, limitações ao princípio da eletividade de sua administração, intervenção da polícia nos pleitos locais etc. (p.50-51).
[26] Ibid., p.255-256.
Resumo: O presente trabalho objetiva refletir sobre alguns traços característicos da vida político-institucional brasileira, tendo como referência certa literatura clássica sobre a política nacional, notadamente as obras Instituições Políticas de Oliveira Vianna, Os Donos do Poder de Raymundo Faoro e Coronelismo, Enxada e Voto de Victor Nunes Leal. Alerta para os problemas e desafios da implantação e funcionamento do regime democrático no país.
Palavras-chave: política institucional, personalismo, patrimonialismo e coronelismo
* O presente artigo corresponde a parte do capítulo II – A Câmara Municipal no contexto brasileiro, da dissertação de mestrado O Legislativo Municipal no Contexto Democrático Brasileiro: um estudo sobre a dinâmica legislativa da Câmara Municipal de Nova Iguaçu, defendida em dezembro de 1999, no Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Ciência Política da UFF.
**  Otair Fernandes de Oliveira é Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais (UERJ e FEUC). Mestre em Ciência Política (UFF). Doutorando em Ciências Sociais (UERJ). Professor Universitário da UNESA.
Contato: telefones: (21) 2669-65-47/2768-6973
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Por um Pacto Federativo Municipalista

Nestas últimas décadas, os municípios receberam mais atribuições – como educação e saúde. Mas isso não se traduziu em um aumento de verbas. Temos que organizar as atribuições de cada ente da federação e a forma de atuação conjunta, para o atendimento das necessidades e anseios de nossa população

por Paulo Ziulkoski

O Pacto Federativo brasileiro foi construído de cabeça para baixo. Enquanto na Europa nós tivemos primeiramente o surgimento das cidades-Estado, que com o passar do tempo criaram zonas de influência e, após conflitos diversos entre si, acabaram fundindo-se em países; enquanto nos Estados Unidos, como o nome já sugere, houve uma união, sob o manto de uma nação, de regiões autônomas que buscavam aumentar sua força; o Brasil, este gigante, nasceu sob a égide de um poder central. Inicialmente era a Coroa portuguesa, que para facilitar a administração de tão vasto território o dividiu em capitanias hereditárias, base dos atuais Estados. Ao longo dos nossos 500 anos, elas se dividiram em 5.562 municípios brasileiros.

Em função deste histórico, em nosso país o poder político, e principalmente a carga tributária, ficaram centralizados na União. Voltando um pouco no tempo, em 1835 nós tivemos a Revolução Farroupilha, em que o Rio Grande do Sul tentou se separar do Brasil em protesto ao fato de que 50% dos tributos gerados no Estado iam para o governo central. Quase duzentos anos depois, este quadro se agravou: atualmente a União concentra 60% da carga tributária, contra 25% dos estados e 15% dos municípios.

Apesar dessa concentração de recursos nas mãos da União, nas duas últimas décadas, após a Constituição de 1988, nós passamos a viver um processo intenso de descentralização da gestão das políticas públicas. Cada vez mais, o ente público que provê os serviços públicos para a população é o município.

Dois exemplos comprovam isso. O primeiro é na área da saúde: em 1986, os municípios possuíam 43 mil servidores neste campo e apenas as grandes capitais tinham hospitais e outros serviços de atendimento. Nos interior, os postos de saúde eram estaduais ou então pertenciam ao extinto INAMPS (Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social). Mas, atualmente, todos os municípios assumiram a gestão da atenção básica de saúde e alguns prestam também serviços de média e alta complexidade. São 200 mil agentes comunitários contratados pelos municípios e 27 mil equipes de saúde da família, com médicos, enfermeiras e auxiliares de enfermagem, que se somam a dentistas, fisioterapeutas, veterinários, etc., totalizando 832 mil servidores. Enquanto isso, no mesmo período, a União reduziu os seus funcionários nesta área de 250 mil para 108 mil.

O segundo exemplo diz respeito à educação. Em 1997, os municípios possuíam 40% das matrículas do ensino fundamental, única modalidade de ensino obrigatória pela nossa Constituição. Então veio o FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental), que estimulava a inclusão de crianças nesta fase do processo educacional. Em 2007, os municípios já possuíam 60% das matrículas desta etapa, que podemos considerar universalizada, pois 97,5% das crianças entre 7 e 14 anos estão nas escolas. São 30 milhões de crianças. Ou seja, os municípios assumiram 6 milhões de novos alunos, tendo de construir cerca de 200 mil salas de aula e dotá-las de professores, servidores, segurança, merenda escolar etc.

Entretanto, a carga tributária continua nas mãos da União, que auxilia a financiar essas funções assumidas pelos municípios através de 145 programas. Estes transferem recursos para custear uma parte de cada atividade executada pelo município, de forma insuficiente.

Para exemplificar isso vamos citar apenas o Programa Saúde da Família (PSF), em que para sustentar uma equipe com médico, enfermeira e auxiliar, a União repassa cerca de R$ 5,4 mil por mês, enquanto o custo, para o município, da manutenção das condições de trabalho destes funcionários é de pelo menos quatro vezes esse valor. No mérito o programa é brilhante, mas no financiamento faz com que os municípios, que possuem um quarto da arrecadação da União, coloquem três vezes mais recursos.

Assim, antes de providenciarmos as tão necessárias reformas política, tributária, trabalhista e previdenciária, temos que organizar as atribuições de cada ente da federação e a forma de atuação conjunta, para o atendimento das necessidades e anseios de nossa população, realizando o que vou apelidar de Reforma Federativa, para botar o nosso Pacto Federativo em sua posição correta de valorização dos municípios.

Paulo Ziulkoski é presidente da Confederação Nacional de Municípios.

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Tese de Doutorado

Título em português: O municipalismo brasileiro e a provisão local de políticas sociais:
o caso dos serviços de saúde nos municípios paulistas
Palavras-chave em português
Cooperação intergovernamental
Descentralização
Federalismo
Municipalismo
Política de saúde
Resumo em português

A tese examina o municipalismo brasileiro após a Constituição de 1988, verificando como os municípios se saem no provimento dos serviços locais de saúde face à descentralização desta política com a criação do SUS. Argumenta-se que o processo de descentralização da saúde desenvolveu-se, ao longo dos anos 90, em duas fases distintas: a fase da descentralização autonomista, entre 1990 e 1998, quando os municípios tinham total liberdade nas escolhas da política local de saúde, e a fase da descentralização dirigida, após a introdução do Piso de Assistência Básica - PAB, quando os municípios começaram a receber recursos "carimbados", destinados exclusivamente a determinados programas de saúde, determinados pelo Ministério da Saúde. Todavia, conforme demonstramos, ambas as fases não foram capazes de minorar as desigualdades regionais existentes, em termos de oferta, acesso e financiamento aos serviços municipais de saúde. Enfim, demonstramos que as desigualdades em saúde produzidas pelo nosso federalismo não foram equacionadas pelo desenho adotado pela política de municipalização da saúde. Somado a isso, demonstramos que os argumentos normalmente utilizados pela literatura sobre federalismo e municipalismo no Brasil, críticos à "onda municipalista" e à existência de milhares municípios pequenos e altamente dependentes dos repasses do Fundo de Participação dos Municípios, não são suficientes para explicar a produção local de políticas sociais, dado que não são estes os municípios que apresentam os piores resultados na política de saúde no que tange à oferta, acesso e financiamento da saúde pelos gestores municipais. Por fim, demonstramos que o consorciamento pode ser um mecanismo eficiente na superação de um dos principais problemas enfrentados pelos pequenos e carentes municípios na provisão de serviços de saúde: o acesso a serviços de maior complexidade, inexistente em diversas pequenas municipalidades, sem que isso acarrete um "efeito carona negativo", ou seja, ao encaminhamento de pacientes para outras municipalidades sem a correspondente contrapartida financeira.
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Documento Tese de Doutorado
Autor Oliveira, Vanessa Elias de (Catálogo USP)
Nome completo Vanessa Elias de Oliveira
E-mail Unidade da USP Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
Área do Conhecimento Ciência Política
Data de Defesa 2007-08-24 São Paulo, 2007
Orientador Almeida, Maria Herminia Brandao Tavares de (Catálogo USP)
Banca examinadora Almeida, Maria Herminia Brandao Tavares de (Presidente)
Arretche, Marta Teresa da Silva
Augusto, Maria Helena Oliva
Fernando Luiz Abrucio
Motta, Celina Maria de Souza

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Urbanismo e municipalismo no Brasil: breve introdução sobre recorte temático adotado

Ampliação do direito à cidade para as populações excluídas das políticas publicas urbanas (2) e ação direta na construção da cidade como lugar de direito das populações (3), são algumas das constatações sobre as atividades do campo disciplinar-profissional do urbanismo no início do século XXI, especificamente do urbanismo no Brasil. Seja partindo da constatação do desafio que ainda hoje existe para produzir tal ampliação (4), ou fechando a análise sobre a ação dos profissionais urbanistas na construção da cidade (5), ambos estudos empreenderam uma análise histórica da formação e continuada construção da prática urbanística no Brasil, para formularem tais considerações.

A pertinência dessas considerações apresentadas, respectivamente, por Maria Cristina da Silva Leme e Margareth da Silva Pereira, sobre a atividade urbanística nas cidades brasileiras, pode, nesse sentido, delinear outras pesquisas no campo da história do pensamento urbanístico no Brasil. No caso do presente trabalho, estas considerações fundamentam uma primeira parte da pergunta central da pesquisa – pelo objetivo principal do estudo sobre o urbanismo no Brasil –, ao longo de um importante momento histórico-político nacional definido inicialmente pela redemocratização de 1945-1946: qual o processo de implementação-estruturação da área temática do urbanismo e, quais foram as discussões e proposições urbanísticas no âmbito do Movimento Municipalista Brasileiro – mais precisamente aquelas produzidas nos Congressos Nacionais de Municípios Brasileiros – entre 1946 e 1964?

Centrado entre dois eventos importantes da história política brasileira, respectivamente, a promulgação da Carta Constitucional em setembro de 1946, e o Ato Institucional Nº 1 baixado em abril de 1964, a pesquisa não ficará restrita às distintas dimensões políticas que ambos eventos encerram. No entanto, é incorreto desconsiderar quão importantes e decisivas tais dimensões representaram aos interesses municipais, sobretudo aquelas consubstanciadas no processo de redemocratização do país após o Estado Novo (1937-1945), pois, nesse contexto, se originou a primeira e principal unidade institucional do Movimento Municipalista no Brasil: a Associação Brasileira de Municípios (ABM), fundada em 1946 (6). Além desta conjuntura política, é fundamental para o interesse da pesquisa sobre as discussões urbanísticas empreendidas no âmbito do Municipalismo Brasileiro, nesses dezoito anos entre 1946 e 1964, toda uma outra conjuntura de mudanças que envolvem necessariamente a dimensão urbano-regional do território nacional – delineado por um intenso processo de urbanização –, pois, necessariamente associadas ao urbanismo e as políticas urbanas implementadas nas municipalidades.

Urbanismo e municipalismo no processo de urbanização brasileiro

Nesse sentido é importante salientar que, se apenas a partir de 1946 se configurou importante processo de inflexão na história política brasileira, já ao longo da década de 1940 e, fundamentalmente a partir da década de 1950, mudanças importantes perpassaram também os campos da economia e da urbanização, transformando as relações entre o sistema urbano-espacial e o sistema de produção. Momento crucial de conformação de uma economia urbana marcada pela intensa industrialização do sistema de produção – focado na região sudeste, mas principalmente em São Paulo –, decorrente de elevados investimentos financeiros para infra-estruturação do território que foram empregados na região da capital paulista – nas décadas que se seguiram (1950-1960-1970) após a redemocratização de 1946 – pelo governo federal. Este aporte de recursos públicos implementados a partir da segunda metade do século XX, viabilizou o primeiro de um conjunto de três ciclos de expansão e desenvolvimento urbano-regional caracterizados pela referida concentração espacial dos investimentos em São Paulo. Segundo Luciano Coutinho, ciclos delineados “por meio de blocos de investimento púbico em infra-estrutura [...]. Cada um dos grandes ciclos de expansão da economia corresponderam políticas regionais urbanas que refletiam a conjuntura de forças políticas, a conjunção de interesses privados e a forma específica de articulação do projeto nacional de desenvolvimento” (7). O primeiro dos ciclos foi definido por Coutinho como “o período Juscelino Kubitschek (1955-1960)”, marcado “por um forte impulso ao processo de industrialização nucleado em São Paulo com investimentos infra-estruturais de integração nacional (em energia e transporte)” e com uma nova política de incentivos aos investimentos no Nordeste mediante a criação da Sudene” (8).

Um ciclo de expansão da economia totalmente inserido no recorte temporal definido pelo objeto de estudo desta pesquisa em andamento, cuja característica pelo investimento em infra-estrutura de energia e transporte direcionado para o sistema produtivo industrial consubstanciou intenso processo de urbanização do Brasil – mesmo que inicialmente atrelado às áreas de interesse (sudeste do Brasil) dos investimentos deste primeiro ciclo. Processo de urbanização também caracterizado por um conjunto de variáveis associadas às mudanças produtivas e espaciais da economia no país, entre as quais mencionaremos quatro que estiveram e continuam intimamente relacionadas aos debates urbanísticos e os municípios brasileiros a partir da década de 1950: movimento migratório em direção às áreas de atração de mão-de-obra para o mercado de trabalho industrial – e neste movimento não só a relação campo-cidade, mas de cidades de outras regiões do país para a capital paulista e demais cidades da região sudeste –, cuja oferta fora criada pela expansão da indústria resultante dos referidos investimentos (9); crescimento da população urbana decorrente inicialmente deste movimento migratório e êxodo rural; expansão periférica das cidades que esta migração acarretou, geralmente relacionada à necessidade habitacional deste contingente populacional em crescimento – inicialmente migratório e posteriormente natural –, também transformado em agente de demanda por melhorias na infra-estrutura urbana de transporte público, saúde, educação, lazer, entre outras, nas áreas em expansão horizontal das cidades; a intensa especulação imobiliária interessada e associada a esse processo de transformação e expansão física das cidades, sobretudo pelas potencialidades comerciais e econômicas das terras urbanas para loteamentos, muitas configuradas como vazios urbanos à espera de maior valorização.

De todas as cidades da região sudeste do país, São Paulo é a que mais intensamente aglutinou este contingente de transformações econômicas e urbanas – mas não unicamente, pois é um processo nacional de mudanças – delineadas a partir da segunda metade do século XX. Nas pesquisas que Paul Singer realizou sobre São Paulo, especialmente aquelas interessadas na interpretação das relações entre a economia e a urbanização, a lógica da concentração espacial do capital na cidade é ainda mais claramente enunciada (10).

Uma cidade caracterizada, segundo Sarah Feldman, pela “intensificação da verticalização, expansão periférica e reestruturação da centralidade”, cujo resultado é apreensível no processo de mudanças da constituição espacial da cidade que perduraria até os anos de 1970 (11). Ainda conforme Feldman, “a configuração metropolitana, o uso extensivo do espaço, a proliferação de arranha-céus, de indústrias, do comércio etc., ocupam o debate urbanístico de São Paulo no período imediatamente posterior à longa permanência de Prestes Maia como prefeito, de 1938 a 1945” (12).

Foi no âmbito desse importante quadro urbano-industrial já intensamente consubstanciado ao final do Estado Novo, que um processo de estruturação dos setores de urbanismo das principais administrações municipais se consolidou, especialmente, pela criação dos Departamentos de Urbanismo (13) – momento em que o Movimento Municipalista também alcança sua legitimação e institucionalização com a fundação da Associação Brasileira de Municípios, entidade responsável pela organização dos Congressos Nacionais de Municípios Brasileiros.

O debate urbanístico no âmbito do movimento municipalista brasileiro-interamericano: questões para uma investigação

Com a criação dos Congressos Nacionais de Municípios Brasileiros em 1950, ou seja, em meio a todo esse debate urbanístico, estes conformaram não só parte do tripé institucional do Movimento Municipalista, como foram fundamentais nas ações específicas da ABM e do IBAM, assim como, na articulação entre ambas, por configurarem-se no principal ambiente de discussão e proposição dos interesses dos municípios brasileiros nas mais diversas áreas da administração pública municipal: saúde, habitação, urbanismo, transporte, educação, cultura, finanças, jurídicas. Em cada um dos certames realizados entre 1950 e 1963 (este em Curitiba, um ano antes, portanto, da instauração do Ato Institucional Nº 1), cada uma dessas diversas áreas de interesse municipal foram discutidas por Comissões Técnicas cujas considerações finais eram publicadas em documentos oficiais sob a responsabilidade da Associação Brasileira de Municípios. Discussões e proposições municipalistas que, no entanto, não só não estavam limitadas ao Brasil, como já ocorreriam desde o final da década de 1930, com o I Congresso Panamericano de Municípios realizado em Havana-Cuba, no ano de 1938, quando se fundou a Organización Interamericana de Cooperación Intermunicipal – O.I.C.I. (14).

Neste contexto municipalista brasileiro-interamericano focar-se-á o estudo nas questões urbanísticas que perpassavam, particularmente, as discussões e proposições dos Congressos Nacionais de Municípios Brasileiros, sem desconsiderar, porém, o caráter relacional entre o municipalismo brasileiro e as deliberações da Organización Interamericana de Cooperación Intermunicipal – O.I.C.I., mediante realização dos Congressos Interamericanos de Municípios, especialmente o VIII Congresso realizado no Rio de Janeiro em 1958. Portanto, um debate continental-interamericano que, no âmbito deste projeto, recebeu o recorte temporal do contexto municipalista democrático brasileiro instituído em 1946 – pela promulgação da Carta Constitucional e criação da Associação Brasileira de Municípios –, e destituído em 1964 com a instauração do regime militar pelo AI-1; ano em que se criou, pela Lei n. 4380 de 21 de agosto de 1964, o SERHAU – Serviço Federal de Habitação e Urbanismo. Momento em que “o planejamento como função de governo ganha um marco institucional federal que formaliza as condições de criação de instituições estaduais, metropolitanas e municipais” (15).

Esta pesquisa pretende, portanto, empreender esforço interpretativo com atenção focada nas questões urbanísticas propugnadas no âmbito do Municipalismo brasileiro. Nesse sentido, tem como objetivo geral e central o levantamento e interpretação das discussões e proposições urbanísticas que ocorreram no âmbito do Movimento Municipalista Brasileiro, especificamente as discussões que perpassaram suas três instâncias institucionais: Associação Brasileira de Municípios (ABM), Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM) e Congressos Nacionais de Municípios Brasileiros (16). O percurso pelas questões urbanísticas dessas três instâncias determina, nesse sentido, o foco de três objetivos específicos da pesquisa. O primeiro deles é a análise daquele processo de incorporação, estruturação e organização da área temática do urbanismo e planejamento urbano nestas três instâncias institucionais do Municipalismo Brasileiro. Este primeiro está diretamente associado ao segundo objetivo, caracterizado pela interpretação das questões urbanísticas arroladas no âmbito da ABM, IBAM e Congressos Nacionais de Municípios Brasileiros e que foram incorporadas na publicação do documento oficial resultante dos Congressos: as Cartas Municipalistas (17).

Estas Cartas são o produto final dos debates ocorridos em todas as Comissões Técnicas de cada Congresso Nacional de Municípios, assim como, resultante das discussões empreendidas no âmbito da ABM e IBAM. Nessas cartas são apresentadas as reivindicações, as recomendações, os direitos, as ações que deveriam nortear as atividades municipais, sempre pautadas pela premissa do desenvolvimento municipal. Por este objetivo específico entender como foram arrolados os desafios e deliberadas as ações pelo campo do urbanismo em respostas aos denominados “problemas urbanos”, que já na década de 1940, estavam associados ao inicio daquele intenso processo de urbanização do território nacional (18).

O terceiro objetivo específico está estruturado na interpretação das discussões urbanísticas municipalistas brasileiras, em seu diálogo com os debates orientados no contexto continental-interamericano pela Organización Interamericana de Cooperación Intermunicipal. Analisar a construção de uma agenda de reivindicações, recomendações, direitos e ações municipalistas nesse contexto, e a inserção dos brasileiros nessa construção. Mapear as formas de inserção e atuação institucional dos profissionais brasileiros vinculados à ABM e IBAM na instância central do municipalismo interamericano: a Organización Interamericana de Cooperación Intermunicipal – O.I.C.I, posteriormente transformada em Organización Iberoamericana de Cooperación Intermunicipal – mudança caracterizada pela inserção do Brasil, Espanha e Portugal como membros desta organização. Posterior, portanto, ao debate municipalista arrolado em outro contexto institucional: os Congressos Hispano-Luso-Americano y Filipino de Municípios, organizados pelo Instituto de Estúdios de Administración Local da Espanha.

Urbanismo e movimento municipalista: uma interpretação hispano-brasileira

Primeiramente é importante salientar que a Organización Interamericana de Cooperación Municipal foi definida a partir da Resolução n. 70 do Primer Congresso Panamericano de Municipios, realizado em Havana no ano de 1938. Uma posterior mudança para Organización Iberoamericana de Cooperación Intermunicipal ocorreu no I Congresso Extraordinário de Montevideo, realizado no ano de 1976, quando da participação “como miembros de número” (19) dos municípios brasileiros, portugueses e espanhóis – este aliás, é o ponto de inflexão e ampliação do escopo da pesquisa inicialmente pensada exclusivamente para o caso brasileiro: entender o processo de construção do pensamento urbanístico no âmbito do Movimento Municipalista no contexto não só Americano, mas fundamentalmente no contexto Iberoamericano, ou seja, aquele que incorpora a atuação de entidades municipalistas espanholas e portuguesas, focado, porém, na relação entre Espanha e Brasil, respectivamente, pelo Instituto de Estúdios de Administración Local e Instituto Brasileiro de Administração Municipal.

Este aspecto particular de entrada conjunta “como miembros de número” dos municípios brasileiros, espanhóis e portugueses na OICI foi o ponto fundamental e justificativo da necessidade de iniciar uma pesquisa específica entre as entidades dos três países. Numa primeira etapa da pesquisa estamos focando atenção sobre as entidades municipalistas brasileiras e espanholas (20) – no caso brasileiro: Associação Brasileira de Municípios, Instituto Brasileiro de Administração Municipal, Congressos Nacionais de Municípios Brasileiros, Revista de Administração Municipal; no caso espanhol: Instituto de Estudios de Administración Local (IEAL), Revista de Estudios de la Vida Local. A pesquisa em Madrid foi justamente direcionada para o levantamento e estudo inicial das questões urbanísticas no âmbito dos debates sobre os municípios, sobre a administração local que estiveram sobre a responsabilidade do IEAL. Desta pesquisa inicial podemos constatar a existência de entidades municipalistas em atuação na Espanha desde a segunda década do século XX: a Unión de Municípios Españoles, que atuou entre 1924 e 1939, posteriormente sendo sucedida pela Federación Española de Municípios e Províncias, com sede atual em Madrid; diferentemente do caso brasileiro, cuja Associação Brasileira de Municípios foi criada somente em 1946.

A pesquisa sobre as questões municipalistas espanholas e os debates urbanísticos foi motivada pela localização nos arquivos do Instituto Brasileira de Administração Municipal (IBAM), de atas dos I e II Congressos Iberoamericanos de Municípios organizados pelo Instituto de Estúdios de Administración Local (IEAL), respectivamente, o Congresso de Madrid em 1955 e Lisboa em 1959. Entretanto, quando desta primeira aproximação com documentos do IEAL, uma pergunta foi formulada: estes Congressos Iberoamericanos são os mesmos Congressos da Organización Iberoamericana de Cooperación Municipal (anteriormente denominada de Organización Interamericana de Cooperación Municipal)? Pesquisas iniciais em atas e documentos também localizados no IBAM confirmaram que não eram os mesmos, pois, não ocorreram Congressos da OICI em 1955, mas em 1954 (San Juan de Puerto Rico) e 1956 (Panamá). Desta constatação elaboramos outras perguntas importantes: qual entidade organizou os Congressos de 1955 e 1959, respectivamente em Madrid e Lisboa? Existiram outros Congressos Iberoamericanos subseqüentes a esses dois primeiros congressos? Qual a relação dos debates entre o municipalismo e urbanismo em desenvolvimento pela OICI, desde o Congresso Interamericano de Havana em 1938, e estes Congressos iniciados em 1955? Quais os profissionais brasileiros envolvidos no debate municipalista no contexto de atuação da OICI e dos Congressos Iberoamericanos?

Com o andamento das pesquisas em Madrid, principalmente na biblioteca e arquivo do Instituto Nacional de Administración Pública (INAP), as primeiras respostas para estas perguntas foram sendo construídas. A criação dos Congressos Iberoamericanos de Municípios sob os auspícios do antigo Instituto de Estúdios de Administración Local (IEAL) ocorreu paralelamente à dos Congressos da OICI. Num primeiro momento, antecedente ao Congresso de 1955 em Madrid, a Espanha foi, segundo o Professor D. Carlos Ruiz Del Castilho (à época Diretor do IEAL),

“invitada como Nación observadora, em los Congressos celebrados por la Organización Interamericana de Cooperación Intermunicipal en el ano de 1953 en Montevideo, y en el ano de 1954 em San Juan de Puerto Rico. A ambas Asambleas asistimos representantes de Municípios y de Organismos técnicos” (21).

Se, como já mencionado, somente em 1976 ocorreu a fusão da categoria “Ibérica” na OICI (passou a ser denominada Organización Iberoamericana de Cooperación Intermunicipal), ou seja, após o Congresso Extraordinário de Montevidéu deste mesmo ano, quando municípios espanhóis, portugueses e brasileiros participaram “como miembros de número” (22), constatamos a ocorrência paralela de dois importantes congressos cujos objetivos estavam centrados no estudo-solução dos diversos problemas municipais: os Congressos Interamericanos da OICI e os Congressos Iberoamericanos do IEAL. Constatação que também responde a pergunta sobre a entidade responsável pela criação e organização técnica dos Congressos Iberoamericanos de Municípios (cuja denominação mais específica é Congressos Hispano-Luso-Americano y Filipino de Municípios): o Instituto de Estúdios de Administración Local – diferentemente do IEAL, que publicara as Crônicas dos seus respectivos Congressos – apenas o congresso realizado no Brasil não foi publicado – (23), a OICI não tem praticamente nenhuma informação sobre os Congressos ocorridos entre a década de 1950 e 1960, período de interesse desta pesquisa sobre o movimento municipalista brasileiro e iberoamericano.

No âmbito deste Instituto de Estúdios de Administración Local, as principais questões municipais em suas mais diversas instâncias foram intensamente abordadas na primeira das quatro áreas temáticas do I Congresso Iberoamericano de Municípios, em 1955: “Problemas de las grandes concentraciones urbanas desde el punto de vista de la organización administrativa y de la gestión urbanística”, coordenada por um importante profissional espanhol, D. Pedro Bidagor Lasarte, à época Jefe Nacional de Urbanismo. Sua presença no Congresso reforça a importância dos debates urbanísticos no âmbito do Movimento Municipalista Iberoamericano, tanto pelos importantes cargos públicos ocupados em sua trajetória profissional (jefatura de la sección de Urbanismo de la Dirección General de Arquitectura del Ministério del Gobiernación em 1939, dirección de la oficina Técnica de Reconstrución de Madrid; Director Técnico de la Comissária General de Ordenación Urbana de Madrid – 1945/1556; Jefe Nacional de Urbanismo – 1949/1956; Director General de Urbanismo del Ministério de la Vivienda – 1957/1969), quanto pelo importante trabalho urbanístico realizado entre 1939 e 1942, o Plan General de Ordenación de Madrid, aprovado em 1944 pela Lei de 25 de novembro (24).

Em seu texto introdutório da temática “Problemas de las grandes concentraciones urbanas desde el punto de vista de la gestión urbanística”, publicada nos Anais do I Congressos Iberoamericano de Municípios, Bidagor Lasarte discute uma das questões centrais ao Movimento Municipalista em relação ao planejamento urbano, qual seja, a questão regional, de cooperação entre as municipalidades. Segundo Lasarte, “el espacio de influência del planeamiento urbanístico há passado, em rápido sucesión, de abarcar primer ola periferia, más tarde, la totalidad de um término municipal; luego, su comarca de influencia. Em seguida se aprecio que si bien el organismo urbano quedaba plasmado dentro dels âmbito comarcal, las vinculaciones entre las diferentes urbes de uma región, y de la nación entera, eram tan fuertes que, evidentemente, su desarrollo se condicionada por exigências y limitaciones mutuas, que requerían uma visión conjunta y superior, obteníndose así la necessidad de formular planes regionales y nacionales de urbanismo” (25).

A abordagem sobre a necessidade de pensar o planejamento em diversas escalas territoriais também foi retomada pelo engenheiro brasileiro José de Oliveira Reis, no artigo apresentado no II Congresso Iberoamericano de Municípios, realizado em Lisboa no de 1959 – o artigo apresentado é na verdade uma nova versão de um texto apresentado no VII Congresso Interamericano de Municípios da OICI, no Rio de Janeiro em 1958: “a interdependência existente entre o planejamento local, urbano, suburbano, metropolitano, regional, estadual, nacional e internacional, mostra que se, política e administrativamente, há limitações de áreas, na realidade esses limites são ultrapassados no estabelecimento dos planejamentos. Para conciliar os interesses jurisdicionais dessas limitações, tem-se proposto a criação de órgãos planejadores em âmbitos nacionais, estaduais e municipais, que devem manter um íntima colaboração” (26).

Importante salientar a indicação da escala “internacional” do texto de José de Oliveira Reis, permitindo uma aproximação com as problemáticas atuais das cidades no contexto da competição internacional por investimentos. No caso brasileiro, uma competição destrutiva das relações cooperativas e associativas entre as diversas municipalidades de um mesmo Estado, ou ainda, como mencionou José de Oliveira Reis, entre Estados. No contexto da chamada “guerra fiscal” (27) em que os Estados e municípios brasileiros estão inseridos, dificilmente a construção de comissões mistas de planejamento poderá ou conseguirá ser instituída e, os interesses coletivos regionais associados às problemáticas comuns (seja ambiental, de uso do solo, habitacional, infra-estrutural, de transporte, entre outras) dos municípios pensados na lógica da cooperação intermunicipal, base da própria denominação da organização municipal iberoamericana, qual seja: Cooperación Intermunicipal. Entender o debate e as proposições ocorridas nas décadas de 1950 e 1960, pelas particularidades políticas, econômicas, culturais, sociais destes períodos é fundamental para pensar o mundo urbano em que vivemos atualmente.
Como explicitou Pedro Bidagor Lasarte, “la extensión de las ciudades constituye uno de los fenômenos mas significativos del mundo contemporâneo. La rapidez del crescimiento urbano, el desarrollo de la vida econômico-social, la complejidad y constante superación de los médios técnicos, son factores que obligan a la Adminstración y a las Empresas constructoras a uma actitud inquieta y vigilante, para estar a la altura requerida por las situaciones que se plantean. La modalidad de la mayor parte de las ciudades actuales, em circunstancia de continua y rápida expansión, es atractiva, por lo que supone de ímpetu y juventude, pero es incómoda, por lo mucho que obliga para garantia de uma personalidad auténtica y de um porvenir fecundo” (28).

Situação que contextualizada para o início do século XXI não é muito distinta das condições explicitadas pelos diversos profissionais que estiveram envolvidos com os debates urbanísticos no âmbito do Movimento Municipalista Iberoamericano.

notas
1. Esta pesquisa está em desenvolvimento desde janeiro de 2006, por integrar parte da pesquisa da tese doutoral desenvolvida na Unicamp sobre o engenheiro José de Oliveira Reis. O texto aqui apresentado articula considerações resultantes desta etapa de pesquisa com questões e problemáticas em processo de elaboração, portanto, não finalizada. Importante salientar que a continuação da pesquisa já ocorreu em dois momentos posteriores à de elaboração da Tese Doutoral: uma etapa realizada em Madrid nos meses de janeiro e fevereiro de 2008 foi financiada pela Fundación Carolina. Nesta etapa realizamos pesquisa na Biblioteca do Instituto de Estúdios de Administración Local de Madrid; uma segunda etapa ocorreu com financiamento da FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), mediante concessão de bolsa pós-doutoral entre os meses de abril e setembro de 2008, sob supervisão da Profa. Dra Maria Cristina da Silva Leme, da FAU-USP.
2. Cf. LEME, Maria Cristina da Silva. “Os desafios do urbanismo no Brasil: ensino e profissão”. In: MACHADO, Denise Barcellos; PEREIRA, Margareth da Silva; SILVA, Rachel Coutinho Marques da. Urbanismo em questão. Rio de Janeiro, UFRJ/PROURB, 2003.
3. MACHADO, Denise Barcellos; PEREIRA, Margareth da Silva; SILVA, Rachel Coutinho Marques da. Urbanismo em questão. Rio de Janeiro, UFRJ/PROURB, 2003.
4. Cf. LEME, Maria Cristina da Silva. Op. cit.
5. MACHADO, Denise Barcellos; et. Al. Op. cit.
6. ABM: Associação Brasileira de Municípios. A primeira assembléia da ABM ocorreu no dia 30 de abril de 1946 após uma reunião de instalação da entidade no dia 15 de março do mesmo ano com a criação da Comissão Nacional Organizadora da Associação Brasileira de Municípios.
7. COUTINHO, Luciano. “O desafio urbano-regional na construção de um projeto de nação”. In: GONÇALVES, Maria Flora; BRANDÃO, Carlos Antônio; GALVÃO, Antonio Carlos Figueiredo (Org). Regiões de cidades, cidades nas regiões: o desafio urbano. São Paulo: Editora Unesp: ANPUR, 2003, p. 39.
8. Idem, ibidem, p. 39.
9. Especificamente sobre a urbanização, a economia urbana, o emprego urbano e seus aspectos demográficos podem ser detalhadamente apreciados em dois estudos publicados em ESTUDOS CEBRAP n. 19, 1977: ”Emprego e Urbanização no Brasil” de Paul Singer; “Aspectos Demográficos da Urbanização” de Felícia R. Madeira.
10. SINGER, Paul. Economia política da urbanização. São Paulo, Brasiliense, 1987, p. 124.
11. FELDMAN, Sarah. Planejamento e zoneamento. São Paulo: 1947-1972. São Paulo, EDUSP/FAPESP, 2005, p. 15.
12. Idem, ibidem, p. 19.
13. São exemplos importantes dessa estruturação, o próprio Departamento de Urbanismo em São Paulo, criado pelo Decreto-lei 431 de 7 de julho de 1947, e o Departamento de Urbanismo do Rio de Janeiro, criado pelo Decreto-lei 8034 de 6 de dezembro de 1945.
14. A Primeira Sede da O.I.C.I foi Havana em Cuba. Em 1960, no Congresso de San Diego, ela foi transferida para San Juan de Puerto Rico. Atualmente a Sede central da O.I.C.I. é em Madrid, onde ocupa parte da sede física da Federación Española de Municípios y Províncias. Uma entidade que possibilitou a construção de um debate inicialmente continental-interamericano sobre os problemas, interesses e ações das municipalidades, e que posteriormente ao Congresso de Montevidéu em 1976, abrangeu a dimensão iberoamericana de municípios, pela incorporação, como membros da O.I.C.I. – que passou nesse momento a ser identificada como Organización Iberoamericana de Cooperación Intermunicipal –, de municípios portugueses e espanhóis.
15. FELDMAN, Sarah. “O arranjo SERFHAU: assistência técnica aos municípios/ órgãos de planejamento/ empresas de engenharia consultiva”. In: Anais do XI Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional. Salvador, 2005, p. 2.
16. Petrópolis em 1950, São Vicente em 1952, São Lourenço em 1954, Rio de Janeiro em 1957, Recife em 1959 e Curitiba em 1963.
17. Como exemplo das Cartas: Carta dos Princípios, Direitos e Reivindicações Municipais (1950); Carta Municipalista de São Vicente (1952); Carta dos Municípios Brasileiros (1954). As questões urbanísticas e de planejamento urbano foram reforçadas em vários pontos das Cartas: como exemplo, na Carta de 1954, pela Recomendação I – Elaboração e estabelecimento de um Plano Nacional de Obras e Serviços Municipais (Operação Município); Recomendação XLVII – Criação de Conselhos Municipais de Urbanismo.
18. COUTINHO, Luciano. Op. cit; SINGER, Paul. Op. cit.
19. In: “La Organización Iberoamericana de Cooperación Intermunicipal”. OICI, Madrid, 2001, p. 23.
20. Etapa que foi desenvolvida em janeiro-fevereiro de 2008 com uma Bolsa de Pesquisa disponibilizada pela Fundación Carolina e com anuência da Escuela Técnica Superior de Arquitectura da Universidad Politécnica de Madrid.
21. Anais do I Congresso Iberoamericano de Municipios. Madrid: IEAL, 1956.p.19.(Este congresso é também denominado de Hispano-Luso-Americano-Filipino de Municípios).
22. In: “La Organización Iberoamericana de Cooperación Intermunicipal”. OICI, Madrid, 2001,p.23.
23. Congresso ocorreu na cidade de Brasília entre os dias 22 e 25 de novembro de 1965. In: Revista de Estúdios de la Vida Local. Ano XXV, noviembro-deciembre, n. 150, p. 890.
24. In: Servicio Histórico do Colégio Oficial de Arquitectos de Madrid
25. In: Crônica del I Congreso Iberoamericano de Municípios. Madrid: IEAL, 1956, p. 151.
26. In: Crônica del II Congresso Iberoamericano de Municipios. Madrid: IEAL, 1959, p. 373.
27. Sobre esta problema: “Da reestruturação corporativa à competição entre cidades: lições urbana sobre os ajustes de interesses globais e locais no capitalismo contemporâneo”. In: Espaço & Debates – Revista de Estudos Regionais e Urbanos. Ano XVII, 2001 – N. 41, p. 26-45.
28. In: Crônica del I Congreso Iberoamericano de Municípios. Madrid: IEAL, 1956, p. 149.

sobre o autor

Rodrigo Santos de Faria, Professor no Departamento de Teoria e História da Arquitetura e Urbanismo da FAU-UnB. Pós-doutorado pela Fundación Carolina/Universidad Politécnica de Madrid-Escuela Técnica Superior de Arquitectura. Mestre e Doutor em História pelo Departamento de História da UNICAMP. Arquiteto-Urbanismo pelo Centro Universitário Moura Lacerda de Ribeirão Preto. Pesquisador do Centro Interdisciplinar de Estudos da Cidade do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP

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Especialização em História do Municipalismo e Políticas Locais , com acesso ao Mestrado em História do Municipalismo e Políticas Locais

Tendo em consideração a política de internacionalização da Universidade Autónoma de Lisboa - UAL, testemunhada pelo elevado número de Protocolos de Cooperação celebrados com instituições congêneres estrangeiras e pela participação de projetos de investigação de âmbito internacional, bem como as relações estreitas entre Portugal e o Brasil, atendeu a UAL às solicitações de várias instituições de ensino superior brasileiras para, num espírito de cooperação, abrir os seus cursos aos cidadãos brasileiros através da colaboração com o Centro de Formação Estudos e Pesquisas – FORUM, na realização do Curso de Especialização em História do Municipalismo e Políticas Locais (Lato Sensu), ministrado no Brasil, com acesso ao Mestrado em História do Municipalismo e Políticas Locais ofertado pela Universidade Autónoma de Lisboa em Portugal. Assim, a UAL e o FORUM concedem oportunidade aos brasileiros de adquirir educação portuguesa e brasileira de qualidade, através do Curso de Especialização Lato Sensu realizado aqui, no Brasil.

A Universidade Autónoma de Lisboa – UAL é um estabelecimento de ensino superior privado reconhecido pelo Ministério da Educação Português como instituição de interesse público. A UAL foi constituída em 13 de dezembro de 1986, pelo despacho do Ministério da Educação nº 123 MEC/86, publicado no Diário da República, 2ª Série, nº 146, de 28/06/86, tendo iniciado o seu funcionamento no ano letivo de 1986/87.
A UAL conta com cerca de 3.000 alunos e 480 professores – mais de 200 com o grau de Doutor e Mestre – e um conjunto de 18 licenciaturas, Pós-Graduações, Mestrados e Doutorados em 05 áreas (Direito, Economia, História, Línguas e Psicologia) todos reconhecidos oficialmente pelo MEC Português. A sede da UAL encontra-se na Rua de Santa Marta, nº 47, 1169-023, Lisboa-PT – telefone: (351) 21 317 7634. A página da UAL na web pode ser acessada no seguinte endereço: (http://www.universidade-autonoma.pt). A Universidade Autónoma prima por garantir internamente o pluralismo e o confronto das idéias, desenvolvendo uma cultura própria, através da abertura aos antigos alunos e à comunidade de dispositivos que visam a formação contínua, ou de atividades a desenvolver pelos Centros de Estudos, com objetivo de estreitar os caminhos do relacionamento entre a Universidade e os universos institucional e empresarial. Na via de um corpo docente privativo, a Universidade Autónoma conta com um conjunto de professores de reconhecida competência acadêmica e profissional, prosseguindo - entre outras vias - a formação avançada de doutorandos e mestrandos, ao abrigo do Programa de Desenvolvimento Educativo para Portugal (Prodep II).

O Centro de Formação, Estudos e Pesquisas - FORUM foi fundado em 07 de junho de 2005, visando o ensino, desde a sua fase elementar, à mais adiantada.
Ainda que jovem, O FORUM é constituído por docentes experimentados nas várias áreas do saber, que têm como missão fazer dele um excelente centro de criação, transmissão, crítica e difusão da cultura, ciência e, num futuro próximo, da tecnologia. O FORUM aplaude e acolhe a liberdade de expressão, política e religiosa, rege-se em estrita obediência e respeito da Lei Civil da sociedade brasileira e valoriza a vontade de crescimento intelectual de cada indivíduo. O FORUM procurará sempre contribuir para o melhoramento e engrandecimento da sociedade brasileira, bem como manifesta primordialmente o seu profundo interesse nos assuntos que respeitam a Lusofonia, sem descurar os sucedidos no fazer geral.

A UAL estabeleceu protocolo de cooperação com o FORUM, onde ambas as instituições se comprometem a desenvolver um conjunto de iniciativas nos planos científico e pedagógico, nomeadamente o Curso de Especialização em História do Municipalismo e Políticas Locais (Lato Sensu) realizado no Brasil, com acesso ao Mestrado em História do Municipalismo e Políticas Locais da UAL (Strictu Sensu), em Portugal, nos termos da legislação universitária brasileira e portuguesa. O Curso de Especialização é organizado da seguinte forma: UAL – Coordenação geral; FORUM – Organização, promoção, divulgação e coordenação administrativa.

O curso de Especialização em História do Municipalismo e Políticas Locais ministrado no Brasil, tem como objetivo específico conferir aos alunos brasileiros a preparação necessária para realizar trabalho científico independente e uma melhor adequação aos padrões de exigência da UAL. A este curso de Especialização será dada equivalência à parte escolar do Mestrado em História do Municipalismo e Políticas Locais ministrado pela UAL, em Portugal, desde que preenchidas as respectivas condições.

Licenciados em História ou em áreas afins, com interesse em aprofundar conhecimentos e desenvolver trabalho científico de mérito.

O candidato que obtiver aproveitamento no Curso de Especialização em História do Municipalismo e Políticas Locais que pretenda posteriormente ascender ao Mestrado em História do Municipalismo e Políticas Locais da UAL, em Portugal, pode requerer a inscrição ao abrigo do artigo 45.º do Decreto-Lei nº 107/2008, de 25 de junho de 2008, publicado no Diário da República Portuguesa, que diz:
Artigo 45.º
Creditação

1 – Tendo em vista o prosseguimento de estudos para a obtenção de grau académico ou diploma, os estabelecimentos de ensino superior:
    a) Creditam nos seus ciclos de estudos a formação realizada no âmbito de outros ciclos de estudos superiores em estabelecimentos de ensino superior nacionais ou estrangeiros, quer a obtida no quadro da organização decorrente do Processo de Bolonha, quer a obtida anteriormente;
    b) Creditam nos seus ciclos de estudos a formação realizada no âmbito dos cursos de especialização tecnológica nos termos fixados pelo respectivo diploma;
    c) Reconhecem, através da atribuição de créditos, a experiência profissional e outra formação não abrangida pelas alíneas anteriores.

2 – A creditação tem em consideração o nível dos créditos e área científica onde foram obtidos.

3 – Os procedimentos adoptar para a creditação são fixados pelos órgãos legal e estatutariamente competentes dos estabelecimentos de ensino superior.

O Curso de Especialização em História do Municipalismo e Políticas Locais ministrado no Brasil, com acesso ao Mestrado em História do Municipalismo e Políticas Locais da UAL (em Portugal), é composto por 11 módulos ministrados por docentes portugueses e brasileiros e tem duração de 18 meses. São doze módulos com carga letiva de 30 horas. Assim, a carga horária total do curso é de 360 horas letivas.
Cada aluno tem de freqüentar as aulas lecionadas, participar de todos os módulos e realizar os trabalhos solicitados pelos docentes. Os trabalhos serão apresentados por escrito, também sujeitos a apresentação oral. O resultado da avaliação, em cada módulo, será a média aritmética de todos os trabalhos solicitados pelo professor, avaliados numa escala de 0 a 20 valores portugueses e 0 a 10 pontos brasileiros.
Para obter êxito no curso, o aluno deverá obter um mínimo de 14 valores portugueses (7,0 pontos brasileiros) nos módulos, com freqüência mínima de 75% das aulas realizadas em cada, apresentar como TCC (Trabalho de Conclusão do Curso) uma Monografia, conforme exigido por Lei, além da apreciação do mérito do projeto de dissertação, ao final do curso, pela Comissão Científica.
Os módulos serão orientados por Doutores portugueses e brasileiros e realizam-se uma vez aproximadamente a cada 40 dias, na quinta-feira das 19h às 22h, na sexta-feira de 08h às 12h e 14h às 19h e no sábado de 08h às 12h e 14h às 19h ou na sexta-feira de 08h às 12h e 14h às 19h, no sábado de 08h às 12h e de 14h às 19h e no domingo de 08h às 12h.
Concluído o Curso de Especialização em História do Municipalismo e Políticas Locais com êxito,  o aluno poderá candidatar-se à apresentação da Dissertação de Mestrado, matriculando-se na UAL, em Portugal. A admissão ao mestrado da UAL está condicionada à aprovação no Curso de Especialização (Lato Sensu) com todas as exigências regulamentares.
A duração total do Curso são 18 meses para a parte letiva (Curso de Especialização em História do Municipalismo e Políticas Locais), mais 12 meses para a elaboração e defesa da Dissertação do Mestrado, contados a partir do momento em que o aluno seja aceite ao Mestrado da UAL, em Portugal.
Concluída, com êxito, a discussão da Dissertação de Mestrado na sede da UAL, em Lisboa (Portugal), o aluno obterá o grau de Mestre em História do Municipalismo e Políticas Locais certificado por uma Carta Magistral, emitida pela UAL.

A Carta Magistral (Diploma de Mestre) terá validade no Brasil após o seu reconhecimento por uma Universidade Brasileira, nos termos dos artigos 39 a 42 do Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta, realizado entre a República Federativa do Brasil e a República Portuguesa (Decreto nº 3.927, de 19/09/01), da Resolução nº 1 do CNE/CES, de 03 de abril de 2001, que estabelece normas para o funcionamento de cursos de pós-graduação no Brasil, e do Parecer 199/2002 do CNE/CES, de 05 de junho de 2002, que trata da aplicação do Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre a República Federativa do Brasil e a República Portuguesa (reconhecimento mediante registro por qualquer universidade brasileira, com dispensa do regime de revalidação previsto pelo art. 48 da LBD).

1. Concepção e Gestão de Sistemas de Informação – 30h/a;
2. Fontes e Métodos para a História do Poder Local – 30h/a;
3. Gestão do Patrimônio Cultural e Desenvolvimento Regional – 30h/a;
4. História do Municipalismo – 30h/a;
5. Imprensa Local e Regional – 30h/a;
6. Interfaces Institucionais e Família – 30h/a;
7. Liderança Participativa – 30h/a;
8. Metodologia da Investigação – 60h/a;
9. Regulação Social e sua Eficácia – 30h;
11. Sistemas Políticos e Processos Eleitorais – 30h/a;
 12. Seminários de Avaliação – 30h/a.

O corpo docente integra doutores do Departamento de História da UAL (Universidade Autónoma de Lisboa), além de doutores de universidades brasileiras com significativa experiência no campo da História.

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GPHUC - Grupo de Pesquisa em História do Urbanismo e da Cidade

Coordenação: Prof. Dr. Rodrigo de Faria

O Grupo de Pesquisa GPHUC trata da história e historiografia da cidade, do urbanismo e do planejamento urbano no Brasil nos séculos XVIII, XIX e XX. Nesta articulação história-historiografia estruturada pela lógica interdisciplinar e da circulação das idéias, o Grupo irá levantar, catalogar e interpretar a construção do pensamento urbanístico no Brasil, o desenvolvimento fisico, social e cultural das cidades, a vida urbana, a problemática do municipio-municipalismo, das instâncias institucionais de assistência aos municípios mediante análise de fontes documentais primárias oriundas dos arquivos dos profissionais urbanístas e instituições públicas e/ou particulares. Planos urbanísticos, memoriais e relatórios, artigos em revistas, anais de congressos, livros entre outros perfazem o escopo documental de trabalho do grupo. Do trabalho de levantamento e catalogação contribuirá para produção não só do conhecimento da área de história do urbanismo e da cidade, mas da sistematização documental para futuras pesquisas do GPHUC e de outros grupos de pesquisa no Brasil. Um grande eixo temático estrutura as atividades do grupo: Urbanismo e Urbanização no Brasil: séculos XVIII-XIX-XX. Deste eixo central surgem os subtemas do grupo (que serão orientadores das linhas de pesquisa): urbanismo e municipalismo no Brasil; memória, cultura e cidade; município, municipalismo e vida urbana; política e legislação no debate municipalista; assistência aos municípios e gestão municipal; engenheiros e urbanistas: biografia profissional e pensamento urbanístico. Um segundo eixo de pesquisa (articulado ao primeiro eixo) perfaz um debate que não está restrito ao Brasil, mas ao contexto Iberoamericano: o municipalismo e os problemas urbanos municipais no âmbito da Organização Iberoamericana de Cooperacion Municipal, desde sua fundação como Organização Interamericana de Cooperacion Municipal em 1938.

Endereço Postal
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Instituto Central de Ciências - ICC Norte - Gleba A
Campus Universitário Darcy Ribeiro - Asa Norte
Caixa Postal 04431 CEP 70904-970 Brasília - DF/Brasil
Endereço eletrônico: gphuc.unb@gmail.com
Site: gphuc-cnpq.blogspot.com.br
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Artigo -  Municipalismo em marcha

14 de maio de 2014

É preciso trabalhar para inverter a pirâmide tributária

LASIER MARTINS
Jornalista

Começou no início da semana, em Brasília, a marcha anual dos prefeitos, até aqui sem resultados satisfatórios. O movimento tem levado ao centro do poder político as reivindicações de mais de 5 mil municípios, sobrecarregados de responsabilidades e esvaziados de recursos. Há muito tempo, eu vinha me manifestando pelo rádio e pela televisão sugerindo mais exigência e definição dos prefeitos, resignados com o comportamento voraz e autoritário da União.
A questão municipalista é bem conhecida, mas repetidamente restrita a debates muito tímidos. A vigente e sufocante centralização de recursos na União tem retirado a autonomia dos Estados e municípios, negando a construção de políticas públicas regionais, como a prestação dos serviços de saúde, educação e segurança adequados aos impostos que são pagos. Além disso, a maioria dos municípios já investe mais de 20% na área, alguns chegando a 32%, superando as determinações constitucionais.
É preciso trabalhar para inverter a pirâmide tributária, distribuindo mais recursos onde as responsabilidades estão concentradas, acabando com esta vigente matriz invertida, concentradora dos recursos em Brasília. É injusto que a União, quando resolve desonerar impostos, transfira o prejuízo aos municípios, como no IPI, minguando ainda mais a receita das cidades, sem a compensação no Fundo de Participação dos Municípios.
A centralização econômica é autoritária e antidemocrática. Põe os municípios à mercê da vontade política do centro do poder. Da distribuição de tratores e patrolas à inauguração de escolas, a maioria das obras e investimentos é do governo federal _ e o ganho político também. É o jogo. E os Estados e municípios nada podem sozinhos.
Neste ano eleitoral, a Marcha dos Prefeitos precisa mostrar sua força. O governo federal, cada vez mais rico e poderoso, e os municípios, cada vez mais pobres e subjugados. É preciso que o governo federal se sensibilize com esta situação injusta e estabeleça relação mais democrática. Precisamos de maior autonomia tributária e descentralização política, com o fim das imposições de cima para baixo. Que os prefeitos deixem de ser submissos. O municipalismo é uma das soluções para melhorar o Brasil.
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Associação Municipalista do Brasil (AMBRAS)
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Municipalismo: chavões e meias verdades

Os políticos – de todos os partidos e matizes ideológicos – adoram repetir um velho discurso que virou chavão e que exalta a importância da cidade. “É nela que se vive, que se trabalha, é onde a gente nasce e morre”, afirmam. “A cidade é o mundo real, é o concreto”. Já o estado e a nação são coisas abstratas, criações institucionais que geram governos que estão lá longe, alienados e insensíveis às necessidades do cidadão.
Os políticos afirmam isso, repetem e a mídia de uma maneira geral acolhe, ecoa e amplia. Esse discurso sustenta a velha tese municipalista do prefeito vitimado. O chefe do executivo municipal é aquela figura heróica, com recursos para lá de escassos, insuficientes e sobre os seus ombros pesam enormes tarefas e responsabilidades, muito superiores às suas forças. Surge uma estranha personagem literário-mitológica, híbrida, um misto de Hércules e D. Quixote.
Essa versão tem alguma verdade, evidente exagero e oculta alguns equívocos. Realmente, as prefeituras brasileiras têm recebido encargos crescentes – a municipalização da saúde e da educação são exemplos bem ilustrativos disso -, nem sempre compatíveis com os recursos adicionais colocados à sua disposição. Mas apesar de reclamar da falta de recursos, que impossibilita a prestação de um bom serviço nas áreas essenciais, é muito comum vermos os prefeitos teimando em criar novas secretarias, ampliar a atuação da prefeitura, estendendo-a a áreas que não lhe competem. A Prefeitura de Porto Alegre é um típico exemplo: aí estão a Secretaria da Copa, da Juventude, de Acessibilidade e Inclusão Social, além do Inovapoa, recentemente criados e que não justificaram sua existência.
Por outro lado – por várias razões que não será possível aqui detalhar -, de um modo geral os prefeitos administram muito mal suas receitas próprias (IPTU, ITBI, ISQN), além de, também, gastar muito mal.
No que diz respeito às duas principais receitas próprias – IPTU e ISSQN -, cabem duas rápidas observações. Sabe-se que a grande maioria das prefeituras cobra mal e muito pouco IPTU. Por razões políticas – é sempre desgastante aumentar imposto direto e o contribuinte está logo ali, na esquina -, e, também freqüentemente, pela falta de adequada estrutura de administração tributária. No que diz respeito ao ISSQN – grande fonte de receita das cidades médias e grandes – ocorrem indesculpáveis omissões. Um exemplo é a última mudança da lei federal, em vigor desde 2004, que aumentou a incidência do imposto viabilizando a sua incidência sobre operações bancárias, leasing, serviços cartoriais e operações com cartões de crédito. A grande maioria das prefeituras gaúchas e brasileiras ou não está tributando ou está cobrando inadequadamente essas operações.
Já com relação às transferências, as prefeituras e suas entidades representativas têm adotado atitude passiva, acomodada. Um exemplo disso é a atual sistemática de distribuição do retorno do ICMS aos municípios. Observe-se que o retorno do ICMS é a principal fonte de receita da maioria das cidades brasileiras.. Temos um modelo distributivo absurdo, injusto e concentrador em vigor há muitos anos. Assentado basicamente no valor agregado, em bom português, na renda gerada no município – que tem um peso de 75%,-, estimula a guerra fiscal e faz com que os municípios ricos recebam cada vez mais e os pobres cada vez menos. No cálculo do índice final de retorno a população, a produção e a produtividade agrícola têm peso infinitamente menor, peso esse que deveria ser consideravelmente aumentado. E introduzida, também, a variável pib “per capita”, de modo que cidades de baixo pib “per capita” recebessem compensações, em detrimento dos de maior renda. A injustiça do atual modelo de distribuição é posto a nu se olharmos os dados de dois municípios gaúchos. Num extremo temos Triunfo, pequena população, PIB “per capita” próximo dos 200 mil reais por habitante. No outro, Alvorada, grande população, PIB baixíssimo (pouco mais de 4 mil reais por habitante). A população de Alvorada é quase nove vezes a de Triunfo, mas os alvoradenses no ano passado receberam sete vezes menos do que o valor recebido por Triunfo. Resultado: em termos do que interessa, por habitante, o prefeito de Triunfo recebeu de retorno do ICMS sessenta vezes o valor recebido por Alvorada. Perguntamos: isso é justo, adequado? O estranho é que nunca se viu a FAMURS criticar esse absurdo critério de distribuição e/ou pedir sua imediata alteração.
Um outro equívoco capital, grave, ocorrido na seara municipalista, foi a malfadada “avalanche emancipacionista” ocorrida no final dos anos oitenta. Foi um típico subproduto do “furor legislativo” do processo constituinte que antecedeu a Constituição de 1988. Muito já se disse, com razão, sobre a paixão brasileira por produzir leis. Nisso somos praticamente insuperáveis. Há milhares e milhares de leis e a cada ano, a cada mês, a cada semana surgem outras. A grande maioria ninguém conhece e muito menos cumpre. Algumas exóticas, outras absurdas. Este ano, por exemplo, a Câmara de Vereadores aqui de Porto Alegre aprovou uma lei que exige uso de fraldas em cavalos! Pode??? Pois a promulgação de uma lei emancipacionista permissiva, facilitadora dos desmembramentos, provocou um verdadeiro “terremoto”: em alguns anos, de poucos mais de duzentos municípios (e prefeituras!) o Rio Grande do Sul chegou número atual: quatrocentos e noventa e sete!
Acontece que a grande maioria dos “recém nascidos” era e é absolutamente inviável: sua população e o seu potencial econômico são absolutamente insuficientes para assegurar aos munícipes os investimentos mínimos e uma boa estrutura de serviços municipais. Originou-se, assim, uma nova e vasta legião de “prefeitos pedintes”.
Não queremos invalidar o discurso e as teses municipalistas. Muitas vezes os prefeitos têm razões justificáveis para reclamar e reivindicar. Mas eles têm, necessariamente, que fazer o que lhes cabe. Ampliar e aperfeiçoar suas equipes fazendárias, administrar seus impostos de forma justa e transparente, especialmente o IPTU, um imposto direto, cuja progressividade é adequada ao princípio da justiça tributária. Cobrar o devido pelos bancos e operadoras de cartões de crédito, mais um exemplo. E gastar melhor, pagando menos por obras e serviços através da melhoria de sua estrutura de licitações.
Ampliando seus recursos próprios, contribuirão para reduzir a imensa fila dos “pedintes-beija mão”, que integram o longo e triste cortejo dos “coitadinhos da República”, na sua costumeira, repetitiva romaria à capital federal.
Paulo Muzell é economista.
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Estão abertas as inscrições para o vestibular da primeira Faculdade Municipalista Mineira, instituição pioneira no país. O processo seletivo será dia 26 de julho na Fundação Presidente Antônio Carlos (FUPAC) de Nova Lima, região metropolitana de Belo Horizonte. Inicialmente, a faculdade oferecerá vagas para os cursos de graduação em Direito e Administração, com início das aulas em agosto e desconto de 30% para servidores públicos e seus dependentes. As inscrições podem ser feitas até o dia da prova, através do site www.institutoamm.org.br.

Os candidatos interessados devem entrar em contato pelo telefone (31) 3657-9199, para mais informações. A iniciativa é uma parceria do Instituto AMM de Ensino e Pesquisa, criado pela Associação Mineira de Municípios (AMM), com a FUPAC.

Instituto AMM

O Instituto AMM é uma entidade sem fins lucrativos, que tem por finalidade contribuir com as organizações públicas e privadas sediadas no país, por meio de ensino, pesquisa e extensão. Foi criado pela AMM para fomentar as ações de capacitação e treinamento de servidores públicos. Propõe a realização de cursos de curta duração, educação superior, pós-graduação – presenciais e a distância -, pesquisa, extensão e certificação ocupacional
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O nome disso é municipalismo

Mario Ribas do Nascimento

As manifestações ocorridas em junho deste ano mostraram a todos nós uma virada no comportamento político da sociedade brasileira. Vivemos um momento desafiador, especialmente para quem tem responsabilidade pública. Àqueles que estão à frente de uma comunidade local, o convite feito pelos cidadãos é claro: sentir o que eles sentem, fazer o que há de ser feito – e, inclusive, dizer ao governo central o que precisa ser dito. Ao contrário de problema, esse exercício é uma função natural dos prefeitos e das prefeitas. Manter contato, olhar para as pessoas e tentar superar os desafios coletivos – tudo isso faz parte do dia a dia dos gestores municipais. E tem um nome: municipalismo. Essa é a nossa bandeira e é dela que o Brasil precisa mais do que nunca!

Valorizar o poder local e aproximá-lo do povo é tudo o que sempre postulamos. Trata-se do cerne da mudança do pacto federativo que propomos e da melhor interação que a política brasileira pode encontrar. Os gestores locais devem ser ouvidos, participar das grandes pautas políticas do Estado e do País. Mais do que isso: precisamos levantar nossas bandeiras, propor reformas, estimular debates, comprar boas brigas, abrir novas reflexões. Defender a bandeira do municipalismo, como faz a Famurs (Federação das Associações dos Municípios do Rio Grande do Sul), significa tratar bem o que nos é próximo. É também cuidar das pessoas desde que elas nascem, ali em nossos hospitais. E, ao mesmo tempo, ajudar a construir um país melhor para que essas mesmas pessoas possam ser felizes individual e socialmente. Nascemos do ventre de uma mãe e, dali, vamos à família e à sociedade. O município, por sua vez, é o primeiro ventre social – é onde nasce a vida em comunidade. É o verdadeiro habitat da felicidade humana. Portanto, vamos todos cuidar muito bem dessa preciosidade!
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SOLUÇÃO PARA FORTALECER O MUNICIPALISMO

SEGER LUIZ MENEGAZ*

A SOLUÇÃO ESTÁ PERTO DE NÓS

No entanto, toda crise gera oportunidade. E, assim que a tempestade passar, vamos conseguir olhar tudo com mais clareza e perceber o que foi nuvem passageira, o que melhorou e o que piorou. Todos aqueles que possuem representação precisam estar especialmente atentos ao que está acontecendo em nossa volta. Como responder a quem, com toda legitimidade, reclama do poder público? Como aumentar a sintonia entre os representantes e os representados, entre os políticos e os eleitores? São questionamentos que exigem respostas imediatas e eficazes.

Uma instituição como a Famurs, cuja presidência assumi recentemente, não pode fugir a esse desafio. A entidade se solidariza com o sentimento da população. E, mais do que isso, propõe um caminho concreto para que os anseios dos gaúchos sejam atendidos: o fortalecimento do municipalismo. Sua essência está na simplicidade e na proximidade. Quanto mais próximo das pessoas e mais simples for o governo, melhor ele vai ser. A prefeitura resolve mais rapidamente os problemas exatamente por isso: porque está perto das pessoas e vai ao ponto, sem tanta burocracia.

Temos no Estado histórias exemplares de inclusão social, de desenvolvimento, de melhoria na qualidade de vida dos cidadãos. Mas poderíamos fazer muito se os recursos e os poderes não fossem tão centralizados na União. Enquanto as receitas diminuem, as obrigações dos gestores municipais não param de crescer. É uma conta que não fecha. Por isso, não vamos cansar de defender um novo pacto federativo. Precisamos aprimorar o que cabe a nós e lutar pelas mudanças que dependem das demais esferas. A solução dos problemas que estão à nossa frente passa pelo municipalismo.

*Presidente da Famurs (Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul) e prefeito de Tapejara
ZERO HORA 05 de julho de 2014 | N° 17850 ARTIGO
sábado, 5 de julho de 2014
 Postado por Jorge Bengochea às sábado, julho 05, 2014
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Municipalismo de resultado

 – Alex Lopes

Mais que os prefeitos aprenderem a fazer o seu dever de casa, cabe ao eleitor também fazer o seu dever das urnas.

O presente artigo é inspirado no exemplo do companheiro Lourivaldo Souza Filho, ex-prefeito de Várzea da Roça, o qual recebeu o Prêmio Juscelino Kubitschek de Melhores Prefeitos do Brasil, gestão 2009/2012.

A honraria é concedida pelo Congresso Nacional de Prefeitos, a partir da análise dos Gestores Municipais na adoção de medidas que demonstrem sensibilidade e compromisso com metas assumidas de desenvolvimento sustentável e proteção ao meio ambiente; seu grau de Empreendedorismo e dinamismo na adoção de medidas orçamentárias participativas; nível de retorno no gerenciamento estratégico; Implantação de programas de capacitação dos servidores públicos para a maior eficiência da Administração; elaboração de redes de proteção social; ação efetiva de controle dos gastos e transparência na aplicação dos recursos financeiros; programas voltados para a redução da mortalidade infantil e dedicação à saúde pública; atendimento a lei de responsabilidade fiscal; e cumprimento de metas nas áreas de saúde e educação.

Os critérios dessa premiação traduzem a compreensão de que o Estado deve, com elevado nível gerencial, priorizar, entre as políticas públicas, aquelas voltadas para a área social, buscando enfrentar as desigualdades que impõem um fosso entre os brasileiros de classes sociais diferentes. Cabe ao Poder Público pautar-se pela meritocracia superando as práticas do clientelismo e/ou assistencialismo, que, na prática, mantém o pobre preso à condição de dependente do Estado.

Seguramente a maior responsabilidade por essa mudança de paradigmas é dos Prefeitos, afinal é nas Cidades onde a relação entre o Poder Público e a Sociedade se faz mais efetiva.

Na implementação dos fins do Estado brasileiro, cabe aos Municípios a atenção básica da saúde, o ensino fundamental, a mobilidade urbana, a sustentabilidade ambiental, etc. À medida que se aperfeiçoam políticas afirmativas, cresce a responsabilidade dos Municípios.

Com a crescente descentralização das ações sociais, é essencial para o seu êxito que estejam a frente das Prefeituras pessoas com uma visão renovada e renovadora de como fazer política.

A elevação das responsabilidades dos Municípios não se fez acompanhar pelo aumento proporcional de receitas. De todo o montante de tributos arrecadados, a União fica com 70% da receita, ao passo que, por exemplo, 77.5% dos investimentos em educação e cultura e 90% em saneamento básico e habitação são feitos pelos Estados e Municípios.

Diante deste cenário, não basta ao Prefeito ter sensibilidade social. Se a Gestão não for orientada por um planejamento estratégico, rigor nos gastos públicos, enfim, encarada com profissionalismo, o Governo estará condenado ao insucesso, com graves prejuízos para a população, com atrasos de pagamentos, queda na qualidade ou até interrupção dos serviços públicos essenciais e na execução de diversos programas sociais.

O Movimento Municipalista Brasileiro, do qual sou ferrenho defensor, tem reivindicado uma maior participação das Prefeituras nas receitas públicas. Cabe, no entanto advertir que, independentemente do pedaço do bolo que caiba aos Municípios, os seus Prefeitos têm que aprender a fazer o seu dever de casa, que é o estabelecimento objetivo das prioridades de sua população. Em outras palavras, cuidar não só da quantidade dos gastos, mas, sobretudo de sua qualidade. Só assim teremos um Municipalismo de resultado.

Mais que os prefeitos aprenderem a fazer o seu dever de casa, cabe ao eleitor também fazer o seu dever das urnas. Se cem Prefeitos conseguiram atingir metas para ganhar o Prêmio Juscelino Kubitschek, é sinal de que, ao contrário do que se pensa, tem gente preocupada em fazer da política um instrumento para a melhoria da qualidade de vida dos brasileiros. Portanto, está nas mãos dos brasileiros às melhores escolhas, que lhes trarão melhores Cidades, melhores Estados e um melhor País para se morar, trabalhar, se divertir, sentir-se seguro, enfim, ser feliz.

 Alex Lopes – Vice-prefeito e secretário da Saúde de Conceição do Coité
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Quem Somos

   O Municipalista é um portal de notícias e serviços voltados à gestão pública e ao municipalismo, com foco prioritário na Região Metropolitana de Tubarão (SC), composta por 18 municípios. Possibilita às prefeituras e câmaras de vereadores ampliarem sua visibilidade, por possibilitar a postagem de notícias das assessorias de imprensa destes entes públicos. O Municipalista também produz seu próprio conteúdo jornalístico, seja em formato de reportagens, seja em forma de entrevista ou artigos. O portal também serve de indicador eletrônico na medida em que possibilita que o internauta encontre neste endereço links para as principais entidades municipalistas nas três esferas – municipal, estadual e federal, bem como, links para institutos e instituições de todo o Brasil, que tratam de assuntos relacionados à gestão pública e ao municipalismo.

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